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Livros Acadêmicos

O papel dos arquivos na produção científica e acadêmica: apontamentos das possibilidades de pesquisas na diretoria de documentação e informações da Unimontes

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Filomena Luciene Cordeiro Reis [1]

João Olímpio Soares dos Reis [2]

DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/livros/3254

Documentos são produzidos e recebidos diariamente em uma instituição com a finalidade de resolver as suas demandas rotineiras. Nessa direção, eles são gerados e, caso a entidade não possua a gestão de documentos, conforme propõe a Lei nº 8. 159, de 08 de janeiro de 1991, ocorre a sua acumulação, produzindo uma massa documental, muitas vezes, incontrolável em vários sentidos, sobretudo para organização, conservação e preservação.  Veja o seu artigo 1º: “Art. 1º – É dever do Poder Público a gestão documental e a proteção especial a documentos de arquivos, como instrumento de apoio à administração, à cultura, ao desenvolvimento científico e como elementos de prova e informação” (BRASIL, 1991).

Verifica-se que, a administração da documentação de uma entidade é dever do poder público, pois viabiliza apoiar os seus gestores nas tomadas de decisões e, ao mesmo tempo, gerar produções científicas e comprovar fatos. Essa “obrigação” promulgada por lei, na sua grande parte, não é cumprida pelos diretores institucionais, fator provocador de acervos documentais sem, minimamente, uma organização arquivística, constituindo um amontoado, literalmente, de papéis. Essa falta de gerência de documentos prejudica, não só a entidade para sua boa conduta como, também, as pesquisas científicas e comprobatórias (BRASIL, 1991).

De acordo com a referida Lei, arquivo consiste:

Art. 2º – Consideram-se arquivos, para os fins desta Lei, os conjuntos de documentos produzidos e recebidos por órgãos públicos, instituições de caráter público e entidades privadas, em decorrência do exercício de atividades específicas, bem como por pessoa física, qualquer que seja o suporte da informação ou a natureza dos documentos (BRASIL, 1991).

Arquivo é definido como o conjunto de documentos que, independentemente da natureza ou do suporte, são reunidos por acumulação ao longo das atividades de pessoas, tanto físicas ou jurídicas, públicas ou privadas. Esse conjunto é constituído de diversos tipos documentais, entre eles, atas de reuniões, projetos de pesquisa, relatórios de atividades, decretos, portarias, resoluções, folhetos, fotografias, ofícios, projetos arquitetônicos, etc., que compõem dossiês de assuntos das funções institucionais (BRASIL, 1991). Nesse sentido, o fato de existir essa documentação permite muitas pesquisas em vários campos de saber, em especial na área das humanidades e ciências sociais, em destaque o profissional da História.

Essa ideia de guardar documentos existe desde o momento da criação da escrita e evolui, processualmente, no decorrer dos tempos (SCHELLENBERG, 1963). Entretanto, nesse desenrolar do tempo, de acordo com Jardim, desde o século XVIII, houve experiências de centralização de arquivos baseadas na proposta do Arquivo Nacional da França, em 1789, imbuída no processo da Revolução Francesa. Esse evento foi significativo para a história dos arquivos, os quais imbuíam do sentido de nação e identidade de um povo. A ideia se referia em administrar os documentos dos órgãos públicos e produtores, inclusive a documentação anterior, colocando o Estado com o dever de cuidar desse acervo, declarando e reconhecendo o direito público de acesso aos documentos dos arquivos. Compreender a instituição arquivística, nessa perspectiva, constituiu a prática na Europa e Américas, considerando suas particularidades e responsabilizando-a pelo recolhimento, preservação e acesso aos documentos gerados pela administração pública. Outro acontecimento importante para a Arquivologia foi a II Guerra Mundial que, com o seu fim, houve a percepção da grande quantidade de documentação produzida, exigindo a necessidade da Gestão de Documentos, primando pela noção de cidadania e a acessibilidade aos documentos públicos (JARDIM, 2015).

Schellenberg esclarece que, os documentos são fundamentos sobre os quais se ergue a estrutura de uma nação (SCHELLENBERG, 1963). Desse modo, constata-se que, documentos, além de auxiliara a administração nas suas atividades-meio, fundamentam a identidade nacional, possibilitando apresentar e moldar características de um determinado grupo e, por esse motivo, faz-se necessário (re)leituras para a formação de uma consciência histórica e historiográfica acerca da compreensão de “nação”. Pesquisadores das humanidades e Ciências Sociais, mergulhados nesse acervo, analisam-nos e interpretam-nos, apresentando narrativas acadêmicas e científicas, contemplando as informações documentais e interrogando-os nas suas entrelinhas e diagonais, encontrando – ou não – respostas. O pesquisador, inquieto, inquire essas fontes, questionando-as o tempo todo para obter dados e argumentos referentes à sua temática, objeto e sujeito de estudo (BLOCH, 2001).

No Brasil, vigora a Lei nº 8. 159/1991, que trata de políticas públicas de arquivos e a Lei nº 12.527, denominada Lei de Acesso à Informação (LAI), aprovada em 18 de dezembro de 2011, versando acerca do livre acesso a qualquer cidadão às informações nos documentos de instituições públicas ou privadas que recebem recursos públicos. Todavia, como viabilizar esse acesso sem políticas públicas de arquivos? Inserido em uma realidade, onde muitos documentos foram perdidos ou não estão organizados ou digitalizados ou não receberam tratamento técnico ou armazenados em locais impróprios ou sem recursos humanos e financeiros para seu cuidado, a Lei nº 12.527/2011 é inviabilizada e as instituições continuam produzindo documentos e criando uma massa acumulada (BRASIL, 1991) (BRASIL, 2011).

Nesse sentido, essa análise objetivou apresentar o papel do arquivo/Diretoria de Documentação e Informações (DDI) da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), localizada em Montes Claros, Minas Gerais, considerada “Referência na produção do conhecimento nas áreas de saúde, educação, ciências sociais aplicadas, ciências humanas e ciências exatas e tecnológicas” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2023, Online) atuando, também, “nos campi de Almenara, Bocaiúva, Brasília de Minas, Espinosa, Janaúba, Januária, Paracatu/Unaí, Pirapora, Salinas e São Francisco. As ações também são incrementadas nos núcleos de Joaíma e Pompéu” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2023, Online), como mantenedora de acervos preciosos para pesquisadores em áreas diversas de conhecimento e recorte geográfico. A Unimontes possui como área de abrangência “40% da área total do Estado de Minas Gerais, incluindo as regiões Norte e Noroeste de Minas e os Vales do Jequitinhonha e do Mucuri” (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS, 2023, Online). A indagação constituída como problema desse estudo é “quais as possibilidades de pesquisa nos arquivos/ DDI da Unimontes?”.

Com o intuito de demonstrar as possibilidades de pesquisa na DDI, esse estudo é qualitativo e descritivo, pois evidencia a documentação sob sua guarda e custódia e os serviços prestados à comunidade em geral. Apesar dos desafios enfrentados para a proteção e guarda do acervo, a DDI, cujo papel consiste na atuação arquivística da gestão, preservação e conservação da memória institucional e regional proporciona as seguintes funções: Serviço de Documentação Regional, Serviço de Arquivo Institucional, Serviço de Pesquisa e Serviço de Tratamento Documental.

O Serviço de Documentação Regional contempla acervos importantes para pesquisas sobre Montes Claros e área de abrangência da Unimontes, entre eles, o Fundo Fórum Gonçalves Chaves, constituído por processos criminais, sendo que, encontram-se digitalizados e microfilmados 55.000 imagens, bem como processos cíveis, eleitorais, trabalhistas e documentos avulsos datados de 1797 a 2000; Fundo Administração Pública de Montes Claros, acervo composto por documentos administrativos de caráter permanente datados de 1824 a 2000, sendo parte, também digitalizada e microfilmada; Coleção Semanário Político, Literário e Noticioso: Correio do Norte (1884-1889), que refere-se a periódicos impressos e encadernados tratando, de maneira geral, dos aspectos sociais, econômicos, culturais e políticos no norte de Minas; Coleção Memória Fotográfica de Montes Claros, composto por fotografias e negativos de Montes Claros e região,  relacionado aos anos de 1911 e 1998; Coleção Jornais “Minas Gerais” – Órgão Oficial do Estado, formada por periódicos oficiais do Estado de Minas Gerais, desde 1969 até os dias de hoje; Hemeroteca: Região Norte do Estado de Minas Gerais constituída por uma  Coleção de  recortes de jornais diversos datados de 1985 até a atualidade; Coleção Antônio Augusto Veloso composta por documentos referentes a essa personalidade política local;  Coleção Imprensa Norte Mineira formada de jornais da região norte-mineira datados de 1916 a 2002, a saber,  Folha do Norte, Jornal de Notícias, Jornal do Norte, Gazeta Norte Mineira, Jornal do Sertão, Semanário Independente, Literário e Noticioso; e outros (REIS; REIS, 2023).

Essa documentação viabiliza muitas pesquisas em vários campos do conhecimento e abarca desde a graduação às pós-graduações Stricto Sensu. Há pesquisas que abordam gênero, por exemplo, versando sobre violência contra mulheres e, também mulheres rés; mundo do trabalho e trabalhadores, entre eles, a escravização; escravos e crimes, lidando com fragmentos do cotidiano; violência, escravidão e liberdade no norte de Minas; História demográfica; famílias e cotidiano; violência no sertão norte mineiro; administração pública; legislações de Montes Claros; posturas municipais; projetos de lei; religião e religiosidades; notícias tratando das diversidades dos cadernos de jornais como cultura, educação, saúde, política, economia, etc. (REIS; REIS, 2023).

A documentação institucional abarca o acervo da Unimontes, contemplando documentos de caráter permanente que possibilita conhecer o processo da educação e ensino superior na região, composto por documentos manuscritos, impressos e digitais relacionados à história da Universidade desde 1962 até os dias atuais (REIS; REIS, 2023). Para as áreas do saber de História e Educação, essas são fontes inesgotáveis para serem inquiridas pelos estudiosos.

Esses documentos, nas mãos hábeis e perspicazes de pesquisadores, tornam-se fontes com repertório e gama variada de textos apresentando diversos assuntos para análise e estudo. Os documentos contêm valores múltiplos, ou seja, histórico, judicial, probatório, pessoal, memória, identidade, etc. (CATELA, 2002). A existência dos arquivos ou órgãos de documentação, locais onde se encontram fontes para pesquisas científicas e acadêmicas, mas, igualmente, documentos comprobatórios e institucionais, viabilizadores de resoluções de questões das entidades, públicas e/ou privadas, bem como pessoais, são imprescindíveis para resultados de narrativas em vários campos do saber.

Essa narrativa se propôs apresentar, de forma sumária, as possibilidades da Diretoria de Documentação e Informações da Unimontes como um celeiro para pesquisadores, cujos interesses contemplam essa região. Como órgão de documentação, a DDI da Unimontes revela condições para atender um público que prima pelos estudos e interessa-se por pesquisar temáticas, objetos, sujeitos e recortes temporais com suas especificidades geográficas, ou seja, as regiões Norte e Noroeste de Minas e os Vales do Jequitinhonha e do Mucuri.

REFERÊNCIAS

BLOCH, Marc. Apologia da História ou Ofício do Historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.

BRASIL. Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8159. Acesso em: 08 maio 2023.

BRASIL. Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm. Acesso em: 08 maio 2023.

CATELA, Ludmila da Silva. “El mundo de los archivos”. In: CATELA, Ludmila da Silva; JELIN, Elizabeth (Orgs.). Los archivos de la represión: documentos, memoria y verdad. Madrid: Siglo XXI, 2002.

DIRETORIA DE DOCUMENTAÇÃO E INFORMAÇÕES. Acervo do Centro de Pesquisa e Documentação Regional.  Disponível em: http://www.ddi.unimontes.br/cepedor/acervo.html.  Acesso em: 08 maio 2023.

JARDIM, J. M. Caminhos e perspectivas da gestão de documentos em cenários de transformações. Acervo – Revista do Arquivo Nacional, v. 28, n. 2, p. 19-50, 2015. Disponível em: http://hdl.handle.net/20.500.11959/brapci/45098. Acesso em: 08 maio 2023.

REIS, Filomena Luciene Cordeiro; REIS, João Olímpio Soares dos. Visita técnica a Diretoria de Documentação e Informações. Montes Claros, 20 abr. 2023.

SCHELLENBERG, T.R. Documentos públicos e privados: arranjo e descrição. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1963.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS. Apresentação. Disponível em: https://unimontes.br/apresentacao/. Acesso em: 08 maio 2023.

[1] Doutora em História pela Universidade de Uberlândia e estágio pós-doutoral em Educação na Universidade de Uberaba. Professora do Departamento de História da Universidade Estadual de Montes Claros e do Curso de Direito do Centro Universitário Funorte. Montes Claros, MG, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2175-8390. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/6184071456334110

[2] Doutorando em Educação pela Universidade Brasília; mestre pelo Instituto Superior Pedagógico Enrique José Varona, Cuba. Professor do Departamento de Educação da Universidade Estadual de Montes Claros. Montes Claros, MG, Brasil. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8246-6028. CURRÍCULO LATTES: http://lattes.cnpq.br/3537740975018159

Filomena Luciene Cordeiro Reis

Filomena Luciene Cordeiro Reis

Doutora em História pela Universidade de Uberlândia e estágio pós-doutoral em Educação na Universidade de Uberaba. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-2175-8390. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6184071456334110.

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