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Criação de sinais-termo para amostra de glossário terminológico de parasitos intestinais humanos em língua brasileira de sinais

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CONTEÚDO

ARTIGO ORIGINAL

ARRAIS-SILVA, Wagner Welber [1], ARRAIS-SILVA, Amanda Angarten [2],  TRANCOSO, Cauãn Torres [3], COSTA, Edivaldo da Silva [4]

ARRAIS-SILVA, Wagner Welber et al. Criação de sinais-termo para amostra de glossário terminológico de parasitos intestinais humanos em língua brasileira de sinais. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 10, Ed. 04, Vol. 01, pp. 39-55. Abril de 2025. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/criacao-de-sinais-termo, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/criacao-de-sinais-termo

RESUMO

A parasitologia é uma área da ciência biomédica que estuda a relação entre o parasito e seus hospedeiros, suas consequências para a saúde do indivíduo, da comunidade e do ambiente. Neste contexto, comunidades negligenciadas são mais susceptíveis ao parasitismo por carências em diferentes níveis, que vão desde determinantes ecológicos até dificuldades de comunicação, como ocorre na comunidade surda, que possui a dificuldade linguística na compreensão da leitura semântica dos determinantes do parasitismo por desconhecimento da compreensão associativa do significado constituinte do nome às causas e sintomas, e também da escrita técnica da palavra referente ao nome do parasito não familiarizado em seu cotidiano. Diante disso, essa pesquisa teve como intuito criar sinais-termo para amostra de glossário terminológico de parasitos intestinais humanos em Libras. A metodologia embasou-se na Teoria Faulstichiana da Unidade Terminológica Complexa Sinalizada (Faulstich; Abreu, 2003). O grupo foi formado por seis informantes surdos acadêmicos do curso Letras Libras Licenciatura da Universidade Federal de Sergipe e foram criados sinais-termo para os seguintes parasitos intestinais humanos: (i) Ancylostoma duodenale, (ii) Ascaris lumbricoides, (iii) Entamoeba histolytica, (iv) Enterobius vermicularis, (v) Giardia lamblia, (vi) Schistosoma mansoni, (vii) Strongyloides stercolaris, (viii) Taenia saginata, (ix) Taenia solium. e (x) Trichuris trichiura. Os sinais produzidos foram registrados em sistema de escrita de sinais conhecido como SignWriting (SUTTON, 2000). No dicionário impresso de Libras (Capovilla; Raphael; Maurício, 2012) consultado foram identificadas duas variações de sinais para o sinal-termo ‘VERME’ que foram convencionados de forma generalizada e utilizado como sinônimo para parasito. Concluiu-se que a criação de sinais-termo técnicos de parasitos intestinais humanos em Libras contribui para o ensino bilíngue de Parasitologia e amplia a discussão do léxico especializado pautada na visuoiconicidade por meio da CM [ ] e sua relação com a estrutura morfofisioanatômica dos parasitos (protozoários e helmintos intestinais) selecionados para esta pesquisa.

Palavras-chaves: Libras, Parasitos intestinais humanos, Saúde Sanitária.

1. INTRODUÇÃO

A Organização Mundial da Saúde chamou a atenção do mundo para que fossem eliminadas as barreiras de acesso à saúde de pessoas com deficiência, incluindo a dificuldade de estabelecer comunicação efetiva entre o staff médico e o paciente (WHO, 2003). Mackenzie e Smith (2009) notaram que pessoas com deficiência têm significativamente maior chance de sentirem que o profissional do serviço de saúde não lhes escuta, não explica o tratamento, ou ainda que, não são atendidas no devido tempo ou tratadas com respeito e envolvidas nas decisões de tratamento.

Neste cenário, a surdez pautada na concepção orgânico-biológica e na incapacidade do indivíduo de estabelecer efetiva comunicação por meio da oralidade e da fala foi, e por muitas vezes, tem sido considera uma deficiência do paciente que compromete a qualidade do serviço médico e estabelece uma relação equivocada entre linguagem e língua oral (Duarte et al., 2013). Este equívoco, pauta os serviços de saúde e leva pessoas com deficiência auditiva a não conseguirem ter acesso à informação clara e efetiva para que possam, através do profissional de saúde, tomar sua decisão sobre a conduta terapêutica. Assim, na perspectiva orgânico-biológica, a surdez é vista como uma barreira ao acesso ao serviço de saúde de qualidade imposta pela deficiência e inabilidade do indivíduo-paciente de desenvolver língua oral (Soleman; Bousquat, 2021).

Por outro lado, a concepção socioantropológica da surdez, considera a particularidade linguística e cultural da surdez, valoriza a comunicação por meio da língua de sinais e o bilinguismo (Viana et al., 2022; Stebnicki; Coeling, 1999). É baseada na cultura surda e considera as diferentes valências cognitivas no uso da língua de sinais, as estratégias sociais e aos mecanismos compensatórios que os surdos realizam para agir no mundo, tais como o despertador que vibra, a campainha que aciona a luz, o uso de mensagens visuais e de texto e a educação bilíngue. Reconhecer a cultura surda é reconhecer as variadas especificidades manifestadas na língua, nos hábitos, nos modos de socialização e de funcionamento cognitivo que dão origem a uma identidade própria e da cidadania da pessoa surda (McLeod; Bently, 1996).

A partir desde cenário, a barreira imposta aos surdos para alcançarem o serviço de saúde de qualidade, deixa de esbarrar na deficiência auditiva do paciente e passa a ser por pertencerem a uma minoria linguística. De fato, o cenário piora com dados que indicam alfabetização insuficiente e inadequada de surdos em língua de sinais no contexto da saúde (Kuenburg; Fellinger; Fellinger, 2016). Por exemplo, parasitos humanos causam morte e morbidez em todo o mundo e estão entre as principais doenças endêmicas em países em desenvolvimento, como a Malária, as Leishmanioses ou Parasitos intestinais (Theel; Pritt, 2016). No entanto, agentes etiológicos de importantes parasitoses que acometem humanos não possuem sinais para termos específicos na Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Esta inadequada carência vocabular limita a compreensão da comunidade surda às especificidades socioeconômicas e à própria biologia e a ecologia da relação parasito-hospedeiro que são relevantes no contexto de educação em saúde, mas também na prevenção, no diagnóstico e na conduta terapêutica de doenças parasitárias.  Esta situação piora com a carência de dados sobre os efeitos da barreira linguística que a comunidade surda enfrenta no cuidado e na prevenção de parasitoses.  De fato, vários trabalhos sugerem que a efetiva comunicação é fundamental para assegurar que pessoas surdas tenham acesso a programas de saúde de qualidade (Hommes et al., 2018; Santos; Portes, 2019).

No Brasil, importantes avanços foram garantidos legalmente, como a presença do intérprete de línguas de sinais em serviços públicos de assistência à saúde (Francisco et al., 2023). No entanto, mesmo quando o serviço de saúde possui intérprete, a carência vocabular em Libras pode ser uma barreira, ou seja, a não existência de sinal específico para determinado sintoma ou agente etiológico complica a evolução favorável do processo infeccioso ou da doença.  A situação se agrava, quando não há um intérprete durante a consulta. Neste caso, pessoas surdas, muitas vezes tem que trazer um membro da família para que os interpretem, mesmo sem possuírem treinamento médico ou valência linguística para explicar procedimentos e métodos de diagnose (Brasil, 2002). Corrobora com este fato, interessante estudo que mostrou que deficientes auditivos não recebem atendimento médico e tratamento de doenças crônicas no tempo apropriado e, por consequência, tem maior taxa de mortalidade, complicações e gastos com cuidados em saúde (Santos; Portes, 2019). Este cenário começaria a mudar com a conscientização e treinamento do pessoal médico em língua de sinais. Para Abou-Abdallah e Lamyman (2021) este processo deveria ser obrigatório nas escolas médicas.

Na interface saúde e Libras, a Lei nº 10.436 de 24 de abril de 2002 regulamentada pelo Decreto nº 5.626 de 22 de dezembro de 2005, no seu Art. 3º destaca que “As instituições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos de assistência à saúde devem garantir atendimento e tratamento adequado aos portadores de deficiência auditiva, de acordo com as normas legais em vigor” (Brasil, 2002; 2005). Além disso, na linha específica de cuidados do Sistema Único de Saúde (SUS) referente à Saúde da Pessoa com Deficiência, o paciente surdo usuário da Libras diante das dificuldades e pouco domínio de outros idiomas escritos, tem enfrentado diversas barreiras comunicacionais e linguísticas nos vários níveis de atenção básica tais como Unidades Básicas de Saúde (UBS), Unidades de Pronto Atendimento (UPA), Serviços de Assistência Móvel de Urgência (SAMU), maternidades, farmácias, clínicas, ambulatórios e hospitais.

Outro ponto relevante, seria a ampliação vocabular das línguas de sinais nas mais diferentes áreas das ciências médicas. Incentivar estudos de validade de conteúdo de sinais, sintomas, doenças e agravos expressos em língua de sinais (Francisco et al., 2023). Também é importante salientar que a língua escrita é essencial para transmitir conceitos complexos, como relações entre parasitos e hospedeiros no contexto ecológico associado a cultura e relações socioeconômicas (Brasil, 2002). Para McCarty, (2004), a língua escrita permite um registro permanente e barato que pode ser transmitido para pessoas que não estão na presença do escritor, sendo esta uma barreira superada pela adoção de uma forma de língua de sinais escrita por meio do sistema visuo-gráfico-esquemático SignWriting (SW), que possibilitou a fluência e os meios para a construção de literatura específica para a comunidade surda. Sendo assim, este trabalho visou validar agentes etiológicos, importantes parasitos intestinais humanos, em Libras e registrá-los em sistema SW.

2. MÉTODOS

A metodologia se fundamentou na Teoria da Unidade Terminológica Complexa Sinalizada (UTCS) de Faulstich e Abreu (2003) que está embasada na Unidade Lexical Sinalizada (ULS) e Unidade Terminológica Sinalizada (UTS). Para criação de sinais-termo técnicos de parasitologia em Libras com ênfase em parasitos intestinais humanos foram selecionados os seguintes termos: 1- Ancylostoma duodenale, 2 – Ascaris lumbricoides, 3 – Entamoeba histolytica, 4 – Enterobius vermicularis, 5 – Giardia lamblia, 6 – Schistosoma mansoni, 7 – Strongyloides stercolaris, 8 – Taenia saginata, 9 – Taenia solium. e 10 – Trichuris trichiura.

Os participantes desta pesquisa foram seis informantes surdos acadêmicos (Fig. 1) que estão cursando o sexto semestre do curso de graduação em Letras Libras Licenciatura do Departamento de Letras Libras da Universidade Federal de Sergipe. A etapa de criação dos sinais-termo selecionados para esta pesquisa se deu em quatro encontros, as amostras foram contextualizadas e os participantes surdos observaram, discutiram, propuseram e convencionaram os sinais associados as experiências visuais. Todos os sinais-termos criados foram registrados em vídeo e escritos em sistema Sutton-SignWriting. O locus para realização desta pesquisa foi o Laboratório de Parasitologia do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Sergipe.

Figura 1:  Aula prática de parasitos intestinais realizada no laboratório de Parasitologia do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Sergipe contendo os informantes surdos participantes da pesquisa

Fonte: Acervo pessoal dos pesquisadores (2024).

Os instrumentos para coleta de dados foram amostras visuais por meio de imagens projetadas dos parasitos humanos intestinais em vídeos para observação de movimentos associadas a utilização de amostras experimentais, reais e preservadas em formol disponíveis em recipientes lacrados (A. lumbricoides e T. saginata) e/ou em material fixado e corado em lâminas posicionadas em microscópios óptico comum para visualização das estruturas morfoanatômicas. Para a contextualização dos conceitos, causas, sintomas e formas de hospedagem dos parasitos selecionados, os termos foram explicados por um pesquisador de Parasitologia pertencente ao Departamento de Morfologia com interpretação simultânea sinalizada pelas intérpretes de Libras da Divisão de Ações Inclusivas vinculada à universidade.

A pesquisa se deu em três etapas: i) criação de sinais-termo para termos de parasitos intestinais humanos por informantes surdos acadêmicos em quatro encontros; ii) validação e produção em vídeo institucional dos sinais-termo e iii) análise linguística, sob as referências comparativas visuais com a da estrutura da Libras (aspectos fonético-fonológicos e semânticos). A descrição detalhada dos encontros se dará a seguir juntamente com a análise dos dados.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Estima-se que 40% da população mundial esteja infectada por parasitos intestinais e que a maioria das pessoas infectadas vivam em países em desenvolvimento (Taghipour et al. 2021). Devido a escala global e as limitações econômicas é fundamental desenvolver estratégias de controle e prevenção que alcancem minorias e populações de comunidades negligenciadas como as de pessoas surdas.

De fato, a dificuldade linguística na compreensão da leitura semântica dos termos técnicos e a própria carência vocabular relacionada a infecções parasitárias em língua de sinais dificultam o acesso desta população às medidas que reduzam o risco de infecção. Sendo assim, nesta proposta visual de criação sinalizada para Libras dos principais parasitos intestinais humanos foram discutidos os sinais-termo em cada encontro estabelecido.

Para as discussões dos sinais-termo foram utilizadas as seguintes convenções: CM (Configuração de Mão), d (Direita), e (Esquerda), i (Inicial) e f (Final). E, para as CM específicas, estas foram retiradas da Figura 2, tida como padrão linguístico da Libras (Felipe, 2005).

Figura 2: Configurações de Mãos da Libras

Fonte: Felipe (2005).

No primeiro encontro foi explicada a proposta da pesquisa e as atividades que seriam desenvolvidas referentes a criação de sinais para terminologias da área de parasitologia em Libras. Além disso, foram mostrados e discutidos alguns termos visuais genéricos já convencionados no DEIT-Libras (Capovilla; Raphael; Maurício, 2012). Nesse dicionário impresso de Libras consultado foram identificadas duas variações de sinais para o sinal-termo ‘VERME’ que foram convencionados de forma generalizada e utilizado como sinônimo para parasito (Fig. 3).

Figura 3: Imagem ilustrativa retirada do DEIT-Libras referente à variação de sinais para o termo verme em Libras

Fonte: Capovilla; Raphael; Maurício (2012, p. 2225).

As verminoses popularmente conhecidas como lombriga (Ascaris lumbricoides) e a solitária (T. saginata e T. solium) foram as únicas indicadas pelos informantes surdos, as demais não tinham conhecimento. E, em discussão convencionaram o sinal apresentado na Figura 4 como apenas para indicar a A. lumbricoides e a CM [ ] tem sua relação com a estrutura morfoanatômica delgada e longilínea do parasita.

Figura 4: Representação ilustrativa de protozoários e helmintos parasitos humanos

Fonte: As ilustrações foram realizadas a mão com o uso de tablet Samsung S7 e caneta digital baseadas nas características morfológicas dos parasitos (2024).

Foram representados fêmea do nematóide Ancylostoma duodenale; fêmea do nematóide Ascaris lumbricoides; protozoário Entamoeba histolytica; fêmea do nematóide Enterobius vermicularis; protozoário Giardia lamblia; casal do trematoda Schistosoma mansoni; fêmea partenogenética de Strongyloides stercolaris; cestoda Taenia saginata e Taenia solium;e fêmea do nematóide Trichuris trichiura.

Também foram mostrados os sinais registrados na pesquisa realizada por Witchs, (2010), os quais foram produzidos por alunos surdos da disciplina Biologia no ensino médio da escola de surdos da região metropolitana de Porto Alegre-RS. Nesse momento, foi explicado que os protozoários que seriam estudados durante a etapa de criação seriam parasitoses intestinais, assim como, os helmintos, os quais serviriam de bases para esse estudo.

No segundo encontro realizado no Laboratório de Parasitologia do Departamento de Morfologia da Universidade Federal de Sergipe, foram criados, por cinco informantes surdos acadêmicos do Departamento de Letras Libras, quatro sinais para parasitos intestinais humanos, tais como: Ancylostoma duodenale (I), Schistosoma mansoni (II), e duas espécies do gênero Taenia, Taenia saginata (III) e Taenia solium (IV), causadores das respectivas doenças, ancilostomíase, esquistossomose e teníase. Com o auxílio de imagens projetadas, da observação direta de parasitos preservados em formol como A. lumbricoides e Tenídeos ou ainda, da observação da morfologia parasitária em lâminas vistas em microscopia óptica comum foi realizada a conceitualização do termo em Libras por meio da interpretação sinalizada dos parasitos. Como mostra a tabela 1, a criação do sinal para Ancylostoma duodenale, nematoda encontrado no intestino de humanos parasitados se deu aos dois pares de dentes do parasito, por meio das CMd [ ] e CMe [ ] (Fig. 4). O Shistosoma mansoni possui dimorfismo sexual e forma casais. O macho mede cerca de 1,0 cm, tem o corpo alongado e se curva nas bordas formando um canal ginecóforo que alberga a fêmea (Fig. 4). O sinal representa, visuoiconicamente, as estruturas morfofisioanatômicas do macho CMe [ ] e da fêmea CMd [ ]. Do gênero Taenia foram criados dois sinais, uma para cada espécie, Taenia saginata, que tem como hospedeiro intermediário bovinos e escólex com quatro ventosas, mas sem acúleos e Taenia solium (IV) que tem como hospedeiro intermediário, suínos e escólex com presença quatro ventosas e acúleos (Fig. 4). No caso, o sinal para Taenia saginata (III) CMe [ ] CMd [ ] representa o corpo longo e achatado do platelminto e as quatro ventosas, já para Taenia solium (IV) CMe [ ], CMdi [ ] e CMdf [ ] também representa o corpo longo e achatado e os acúleos (Tabela 1).

No terceiro encontro, foram criados, por quatro informantes surdos acadêmicos, três sinais para parasitos intestinais humanos, tais como: Enterobius vermicularis (V), Giardia lamblia (VI) e Entamoeba histolytica (VII), causadores das respectivas parasitoses intestinais, oxiuríase, giardíase e amebíase. Na tabela 1, podemos perceber em que a criação do sinal para Enterobios vermicularis, nematoide causador do prurido na região perianal, se deu por meio da CMd [ ] representando o corpo delgado do parasito e as CMei [ ] CMef [ ] representam a eliminação de ovos durante a migração da fêmea do intestino grosso para a região perianal (Fig. 4). No caso do sinal representativo para Giardia lamblia (VI) protozoário flagelado encontrado em águas e alimentos contaminados a CMe [ ] representa a morfologia piriforme do corpo celular e CMd [ ] (Tabela 1) representa os quatro pares de flagelos (Fig. 4). O sinal criado para Entamoeba histolytica, protozoário encontrado em alimentos e águas contaminadas, como mostra a tabela 1, se pautou nas CMe [ ], CMdi [ ] e CMdf [ ] representando a capacidade do parasito de realizar a fagocitose e emitir pseudópodes para se descolar (movimento ameboide) (Fig. 4).

No quarto encontro foram criados, por seis informantes surdos acadêmicos, dois sinais para parasitos intestinais humanos, tais como: Strongyloides stercolaris e Trichuris trichiura causadores das respectivas doenças, estrongiloidíase e tricuríase. O Strongyloides stercolaris é um geohelminto, parasito intestinal de humanos, comumente associado a áreas sem saneamento básico. Diferente de outros nematoides, o S. stercoralis possui uma fêmea triploide que se reproduz por partenogênese e é a responsável pelo parasitismo em humanos. A criação do sinal-termo possui CMe [ ] representando a fêmea triploide e a CMdi [ ] CMdf [ ] a sua morfologia (Tabela 1); já o parasito Trichuris trichiura que também é um geohelminto, comum em populações vulneráveis, parasita a mucosa do intestino grosso de humanos as CMdi [ ] e CMdf [ ] representam visuoiconicamente a estrutura morfologia do parasito (Fig. 4).

A figura 5 mostra os informantes surdos observando as peças em conservação dos parasitos estudados tanto a olho nu (Fig. 5A), quanto com auxílio de microscópio óptico comum (Fig. 5B). A experimentação auxiliou a observação realística e detalhista de sinais que foram criados por uma parte da estrutura ou sua totalidade utilizando os classificadores como, por exemplo, a estrutura delgada e longilínea.

Figura 5: Informantes surdos observando os parasitos estudados

Fonte: Acervo pessoal dos pesquisadores (2024).

Como triangulação dos dados, a tabela 1 traz uma amostra de glossário visuo-gráfico-esquemático terminológico para sinais-termo de parasitos intestinais humanos com base nos dados obtidos nesta pesquisa.

Tabela 1: Vocabulário terminológico de parasitos intestinais humanos em Libras

Fonte: Elaborado com base nos dados da pesquisa e acervo pessoal dos pesquisadores (2024).

Ao término todos os sinais-termo foram revisados e (re)validados e estão em processo de registro em vídeo institucionalizado que serão produzidos e depositados em plataforma virtual para ampla divulgação dos resultados entre os usuários de Libras.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluiu-se que a criação de sinais-termo se fundamentou na visuoiconicidade em Libras por meio da CM [ ] e sua relação com a estrutura morfofisioanatômica delgada e longilínea do parasito. A base visual tem permeado grande parte das relações linguísticas da Libras com a linguagem técnico-científica.

A incorporação de movimento interno dos dedos como flexão, extensão, alternância e simultâneo contribui para representar dentes na cavidade bucal, movimento serpentiforme, migração perianal, movimento ameboide e flagelos. E, as configurações de mãos, triploidismo, morfologia piriforme e escólex.

Os sinais-termo dos protozoários Entamoeba hyitolytica e Giardia lamblia estão vinculados a mobilidade dada pela emissão de pseudópodes ou presença de flagelos, respectivamente. Já os sinais-termo dos helmintos Enterobios vermicularis, Taenia saginata. Taenia solium, Strongyloides stercolaris, Ancylostoma duodenale, Ascaris lumbricoides, Shistosoma mansoni e Trichuris trichiura, com exceção do A. duodenale, os demais se configuram em CM [ ] reconfirmando a relação de padrão linguístico existente com a estrutura morfofisioanatômica delgada e longilínea dos parasitos e preservando a visuoiconicidade na criação. Essa produtividade grupal por surdos e o estudo conceitual e terminológico proeminentes ancorados na discussão convencionada dos sinais-termo contribuem para a expansibilidade lexical e segmenta a generalidade terminológica e para o ensino bilíngue de Parasitologia.

REFERÊNCIAS

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[1] Orientador. Doutorado em Parasitologia. Graduação em Biomedicina. ORCID: 0000-0001-5417-4303. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0538721794248574.

[2] Aluna de Graduação em Pedagogia. ORCID: 0009-0007-6626-3988.

[3] Estudante de Graduação em Farmácia. ORCID: 0009-0000-4592-0490.

[4] Doutorado em Educação. Graduação em Química. ORCID: 0000-0001-7793-7289. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/3868086261085410.

Material recebido: 08 de fevereiro de 2024.

Material aprovado pelos pares: 12 de setembro de 2024.

Material editado aprovado pelos autores: 07 de abril de 2025.

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Wagner Welber Arrais-Silva

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