REVISÃO INTEGRATIVA
LINHARES, Murilo da Silva [1], SANTOS, Bráulio Érison Franca dos [2], BEZERRA, Rodolpho Montenegro [3], MELO FILHO, Henrique de Oliveira [4]
LINHARES, Murilo da Silva et al. Transtornos psiquiátricos no Covid longa: revisão integrativa da prevalência global. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 24, Ed. 02, Vol. 02, pp. 05-24. Fevereiro de 2025. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/saude/transtornos-psiquiatricos, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/saude/transtornos-psiquiatricos
RESUMO
A pandemia de Covid-19 trouxe impactos relevantes e duradouros na saúde mental de grande parte dos indivíduos que tiveram contato com o vírus SARS-CoV-2, especialmente aqueles que manifestaram determinados sintomas após a infecção inicial, caracterizando a síndrome pós-covid. Este estudo buscou realizar uma revisão integrativa da literatura para elucidar a prevalência de transtornos psiquiátricos associados ao Covid Longa, tais como ansiedade, depressão, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e distúrbios do sono, bem como determinar com base nos estudos os principais fatores de risco associados à COVID Longa. Para tanto, foram pesquisados artigos completos nas bases de dados de pesquisa Scientific Eletronic Library Online, Biblioteca Virtual em Saúde e PubMed, publicados entre 2020 e 2024, nos idiomas inglês e português. Após a triagem, 19 estudos foram incluídos. Destacam-se os resultados: alta prevalência de ansiedade e depressão, distúrbios do sono e TEPT. A faixa etária pediátrica apresentou menores taxas de sintomas, porém com efeitos significativos no desenvolvimento socioemocional. Fatores determinantes que indicam maior vulnerabilidade são: sexo feminino, idade avançada, comorbidades prévias, infecções graves e internação em Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Desse modo, conclui-se que os psiquiátricos associados à Covid Longa são frequentes e persistentes, apresentando implicações profundas na saúde global, o que evidencia a necessidade de estratégias multidisciplinares e personalizadas de reabilitação com enfoque no suporte psicológico.
Palavras-chave: COVID Longa, SARS-CoV-2, Saúde Mental.
1. INTRODUÇÃO
A Covid-19 é provocada pelo vírus SARS-CoV-2, identificado pela primeira vez em Wuhan, China, em 2019. Desde seu surgimento, a doença teve um impacto significativo na saúde pública global devido à rápida transmissão por meio de gotículas respiratórias e contato com superfícies contaminadas (Doremalen, 2020). O medo constante da contaminação, o isolamento e a incerteza acerca do futuro resultaram em aumento de casos de ansiedade e depressão, evidenciando a interconexão entre a saúde física e emocional. No decorrer da pandemia, foram adquiridos conhecimento progressivamente acerca dos prováveis mecanismos responsáveis por essas alterações psíquicas. Assim, a pandemia trouxe reflexões sobre a importância do bem-estar mental em um contexto de crise e pós-crise.
Durante a pandemia, observou-se um aumento na persistência de sinais e sintomas após a fase aguda da Covid-19 caracterizados por manifestações gripais e comprometimento de sistemas mais complexos, como neurológicos, osteomusculares, endócrinos e psiquiátricos. Essas condições são conhecidas como Covid Longa ou síndrome pós-Covid, podendo durar semanas ou se transformar em quadros crônicos (Miranda, 2022). Embora a Covid-19 seja primariamente uma doença respiratória aguda, há crescente evidência de seus efeitos prolongados em alguns indivíduos (Lopes, 2023).
As complicações da Covid-19 podem ocorrer a curto, médio e longo prazo, frequentemente afetando pacientes que sobreviveram a formas graves da doença (Paz Les, 2021). Contudo, a síndrome pós-Covid também pode impactar aqueles com sintomas leves ou moderados, especialmente em relação a manifestações cognitivas e emocionais, como ansiedade, insônia e depressão (Nalbandian, 2021).
Ainda não está definido como a saúde mental é afetada pela síndrome pós-covid. No entanto, acredita-se que ocorra um processo complexo no qual o vírus impacta diretamente o sistema nervoso central causando desmielinização e neurodegeneração. Além disso, a chuva de citocinas inflamatórias induzidas pelos Sars-CoV-2 afeta os neurotransmissores e influência no desenvolvimento de transtornos de humor. Por fim, o estresse oxidativo, a disfunção mitocondrial e a isquemia causados pela disfunção microvascular e trombose, pode causar a formação de pequenas lesões cerebrais, resultando em comprometimento neurológico persistente (Seighali, 2024).
Desse modo, torna-se evidente a necessidade de pesquisas acerca dos transtornos psiquiátricos resultantes da síndrome pós-COVID-19, visto que é fundamental compreender as nuances da síndrome para o desenvolvimento de estratégias multidisciplinares e personalizadas de reabilitação com foco no suporte psicológico e em medidas precoces de intervenções. Portanto, foi conduzida essa revisão integrativa para abordar tais questões, compilando dados sobre a prevalência de transtornos mentais entre pacientes que vivenciaram a síndrome pós-COVID-19.
2. OBJETIVOS
Este estudo buscou realizar uma revisão integrativa da literatura para elucidar a prevalência de transtornos psiquiátricos associados à COVID Longa, bem como determinar os fatores de risco associados às manifestações psiquiátricas nesse grupo.
3. MATERIAL E MÉTODOS
A pandemia do Covid-19 trouxe impactos relevantes para a população global na medida em que expôs a novos desafios tanto de saúde pública e política quanto de consequências a longo prazo para aqueles que sobreviveram à infecção aguda, a citar os distúrbios psiquiátricos da Covid Longa. Nesse contexto, diante da necessidade de entender quais transtornos estão presentes na população ao redor do planeta, esse estudo buscou realizar uma revisão integrativa da literatura sobre a prevalência dos transtornos psiquiátricos decorrentes do COVID Longa.
Na etapa “Identificação”, realizada em 6 de outubro de 2024, conduziu-se uma utilizando as bases de dados Biblioteca Virtual em Saúde (BVS), PubMed e Scientific Electronic Library Online (SCIELO). Inicialmente foram empregados os descritores em saúde “Saúde Mental”, “SARS-CoV-2” e “COVID Longa”, interligados pelo conector lógico “AND” sendo identificados 5163 estudos (3.542 na BVS, 1.611 no PubMed e 10 na Scielo). Adicionalmente, aplicou-se filtros temporais, restringindo as publicações ao período entre 2020 a 2024; linguísticos, limitando a seleção das publicações em português e inglês; e quanto ao tipo de estudo, optando-se por artigos classificados como “Revisão Sistemática” e “Ensaio Clínico”.
Ao final dessa fase, foram obtidos 347 artigos na BVS, 87 na PubMed e zero artigos na Scielo. Iniciou-se, entre 13 de outubro de 2024 a 24 de outubro de 2024, a etapa de “Triagem”, procedendo-se com a seleção das publicações a partir da leitura do título e do resumo ou caso houvesse duplicação. Dessa forma, restaram 42 artigos na BVS, 08 na PubMed e zero na Scielo.
Por último, na etapa de “Inclusão”, foi realizada a leitura do texto completo no qual foram eliminados os artigos que não atendiam aos critérios de elegibilidade, como o relato de sintomas psiquiátricos decorrentes da COVID-19. Restaram 16 estudos na BVS, 03 na PubMed e zero na Scielo.
A aplicação foi realizada por meio de um fluxograma (Figura 1) que abrange três etapas: “Identificação”, “Triagem” e “Inclusão”. Em cada etapa, foram registrados o número de artigos excluídos em cada base de dados, bem como aqueles que avançaram para a análise posterior, culminando no total final de artigos que serão utilizados na revisão (Galvão, 2015).
Figura 1: Fluxograma de pesquisa sobre transtornos psiquiátricos no Covid Longa: revisão integrativa da prevalência global

4. RESULTADOS
Os resultados encontrados evidenciaram que além dos acometimentos sistêmicos gerais a longo prazo, a infecção por SARS-CoV-2 resultou em sequelas neuropsiquiátricas, caracterizando a Covid Longa.
Constata-se que em 10 (52%) estudos a prevalência foi igual ou aumentada de doenças neuropsiquiátricas quando comparada com a população geral. Além disso, 11 (57%) artigos apontam que fatores como, gênero, diagnósticos psiquiátricos prévios, hospitalização, idade, grau de infecção, presença de outras comorbidades anteriores a infecção por COVID, nível de educação, estado civil e obesidade foram relacionadas ao desenvolvimento de problemas psiquiátricos.
As principais manifestações psiquiátricas foram: depressão maior, ansiedade, insônia e fadiga, com maior prevalência em menores de 18 anos e adultos. Além disso, os fatores de risco, como a história psiquiátrica, foi o principal determinante para o desenvolvimento de distúrbios mentais.
Ademais, podemos destacar que a necessidade de internação hospitalar foi um agravo relevante e cerca de metade dos pacientes acometidos pelo covid desenvolveram sequelas neuropsiquiátricas em até 12 meses. Concomitante a isso, não se encontrou uma diferença significativa do acometimento psiquiátrico entre os gêneros. Esses resultados foram condensados na Tabela 1, acompanhado dos métodos, resultados e conclusões de cada artigo deste estudo.
Tabela 1. Compilação dos resultados encontrados nos artigos selecionados nos anos de 2020 a 2024
AUTOR, ANO | MÉTODO | RESULTADOS | CONCLUSÃO |
Bourmistrova et al, 2022 | Revisão Sistemática | Em 33 estudos de coorte com pacientes adultos, de 1 a 6 meses após o diagnóstico de COVID-19, não houve aumento significativo de ansiedade, a prevalência de transtornos de humor a longo prazo foi baixa, as taxas de TEPT relacionadas à COVID-19 variaram e a prevalência de distúrbios do sono foi baixa. | A ansiedade, depressão e distúrbios do sono foram comuns no curto prazo após a COVID-19, mas os sintomas a longo prazo foram semelhantes aos da população geral, indicando que fatores psicossociais indiretos da pandemia podem ter influenciado. |
Seighali et al., 2024 | Revisão Sistemática e Meta-análise | Em 165 estudos com quase 10 milhões de pacientes, a prevalência de depressão, ansiedade e distúrbios do sono pós-covid foi de 23%, 23% e 45%, respectivamente. | A associação dos fatores de risco com o mecanismo fisiopatológico do vírus resulta em maiores taxas de transtornos mentais em pacientes com COVID Longa do que na população em geral. |
Fazzini et al., 2022 | Revisão Sistemática e Meta-análise | Em 48 artigos, após 5 anos de acompanhamento, pacientes com SDRA clássica apresentaram o dobro de prevalência de ansiedade e depressão em comparação aos com SDRA por SARS-CoV-2. Além disso, a incidência de TEPT foi 10% maior. | Pacientes com SDRA podem apresentar redução na qualidade de vida relacionada à saúde e comprometimento funcional e mental, e os sintomas podem não se recuperar completamente até 5 anos após a alta da UTI. |
Hovagemyan et al., 2023 | Revisão de Literatura | Em 11 estudos com pacientes com COVID-19 por pelo menos 4 semanas, a prevalência de depressão e ansiedade foi semelhante entre aqueles com ou sem histórico psiquiátrico. Porém, histórico psiquiátrico foi associado a curso mais grave de COVID longa, com recuperação mais lenta e piores desfechos em comparação com pacientes saudáveis. | Pacientes com histórico de doença psiquiátrica podem experimentar efeitos piores da COVID longa. |
Mat Hassan et al., 2023 | Revisão Sistemática e Meta-análise | Treze estudos acompanharam crianças e adolescentes com COVID longa e encontraram prevalências de 9% para ansiedade, 15% para depressão, 6% para dificuldade de concentração, 9% para distúrbios do sono, 13% para mudanças de humor e 5% para problemas de apetite. A ansiedade e a depressão apresentaram prevalência significativamente maior (2x) em comparação com a população da mesma idade sem COVID-19. | Crianças que tiveram COVID-19, tanto hospitalizadas quanto não hospitalizadas, tiveram mais de duas vezes mais chances de desenvolver depressão e ansiedade em comparação com as não infectadas. |
Zakia et al., 2023 | Revisão Sistemática | 23 artigos acompanharam adultos e idosos com pelo menos 4 semanas de diagnóstico por Covid-19. Ratificou-se fatores de risco e prevalência para ansiedade (6,8% – 47,8%), depressão (4,4% – 35,9%), TEPT (13% – 42,8%), distúrbio do sono (4,4% – 50%) e TOC (26%). | Ansiedade, depressão, distúrbios do sono e TEPT foram frequentes entre participantes com COVID longa. Fatores de risco apontados: sexo feminino e ter diagnósticos psiquiátricos prévios. |
Liu et al., 2021 | Meta-análise | Após a alta hospitalar, sintomas mentais significativos diminuíram no ano seguinte, mas permaneceram mais elevados que em indivíduos saudáveis, com alguns pacientes mantendo sintomas clínicos após mais de um ano. Os sintomas mais severos iniciais incluíram somatização, depressão, ansiedade, fobia social, TOC e sintomas físicos como falta de ar e dor. | Quase todos os sintomas podem ser mais intensos na alta hospitalar ou antes dela. No entanto, os sintomas mentais associados à infecção por coronavírus persistem por muito mais tempo do que os sintomas físicos. |
Deng et al., 2021 | Revisão Sistemática e Meta-análise | A análise de 31 artigos de diferentes países concluiu que a prevalência de depressão em pacientes com COVID-19 foi de 45%, ansiedade de 47% e distúrbios do sono de 34%. Os transtornos psiquiátricos foram considerados de causa provavelmente multifatorial. Não houve diferença na prevalência desses sintomas entre os gêneros. Em casos graves, pacientes com COVID-19 apresentaram tendências suicidas e autodestrutivas | Pacientes com covid-19 tiveram alta prevalência de depressão, além de ansiedade e distúrbios do sono, associados a etiologias multifatoriais. Não houve diferença significativa entre os gêneros. Nos casos graves, pode haver tendência ao suicídio e autodestruição. |
Zeng et a.l, 2023 | Revisão sistemática e meta-análise | Uma análise de 151 artigos com 1.285.407 pessoas de 32 países mostrou que 19,7% dos pacientes apresentaram sintomas psiquiátricos. Homens e idosos tinham maior risco de relatar sintomas. Os problemas mais comuns foram depressão, TEPT, ansiedade (leve/moderada mais frequente que grave) e distúrbios do sono. | Cerca de metade dos pacientes após a infecção por COVID-19 podem apresentar sequelas físicas e neuropsiquiátricas a longo prazo até 12 meses após a alta, com fatores de risco como sexo, idade, grau de infecção e biomarcadores alterados influenciando essas sequelas. |
Hend Ibrahim et al., 2023 | Estudo de coorte | Após 6 meses de acompanhamento, a ansiedade foi mais prevalente em pacientes com comorbidades prévias (68,5%) em comparação com os sem comorbidades (45,9%). A depressão também foi mais comum entre os pacientes com comorbidades (47,7% versus 21,6%). O TEPT afetou 36,6% dos pacientes com comorbidades e 21,6% dos sem. Fatores como nível de educação, estado civil e ansiedade basal influenciaram a depressão após 6 meses. | A covid-19 tem impacto psicológico similar em pacientes com e sem comorbidades prévias. Entretanto, os pacientes com comorbidades continuam a mostrar depressão no acompanhamento de longo prazo. |
Qiangru et al., 2023 | Revisão sistemática | Após a fase aguda da COVID-19, 25% dos pacientes mantiveram sintomas neuropsiquiátricos. Aos 12 meses, seis sintomas continuaram acima de 10%, incluindo distúrbios do sono (30%), dificuldades de concentração (27%), depressão (26%), ansiedade (25%), TEPT (23%) e memória prejudicada (19%). Pessoas com alto risco de COVID longa têm as seguintes características: sexo feminino, obesidade, comorbidades respiratórias, fase aguda grave ou crítica e hospitalização por COVID-19. | Os sintomas neuropsiquiátricos têm efeitos adversos à saúde mais duradouros e afetam mais pessoas do que os sintomas físicos. Fatores de alto risco: sexo feminino, obesidade, comorbidades respiratórias, fase aguda grave ou crítica e hospitalização por Covid-19. |
Mazza et al., 2023 | Revisão sistemática | A pandemia de COVID-19 levou a um aumento de 27% nos casos de transtorno depressivo maior globalmente. No entanto, a prevalência de depressão diminuiu com o tempo, caindo de 44% durante a infecção aguda para 15% após três ou mais meses de acompanhamento pós-infecção. | Ainda que a depressão no período pós-agudo possa manter um padrão de queda, ainda sim, pela quantidade de infectados, mostra-se como um sintoma percentualmente de extrema relevância. |
Rehab et al., 2022 | Revisão sistemática | A análise de 69 estudos com 146.725 pacientes revelou que 28 estudos de 12 países relataram complicações psicológicas e neurológicas entre os sobreviventes da COVID-19. O TEPT foi uma das complicações mais comuns, especialmente em mulheres. Depressão e ansiedade também foram frequentes, com a ansiedade sendo mais grave em sobreviventes mais jovens em comparação com os idosos. | Os sintomas psicológicos e neurológicos entre os sobreviventes da Covid-19 são consideráveis entre os países avaliados, tais como TEPT, depressão e ansiedade. |
Simeon et al., 2022 | Revisão sistemática | A análise de 59 estudos mostrou que 39% dos sobreviventes da COVID-19 enfrentaram condições psicológicas leves a moderadas e 19% vivenciaram problemas graves por mais de 12 semanas. A maior parte desses problemas foi mais prevalente durante a infecção aguda do que no estágio pós-doença. | Houveram altas taxas de prevalência de distúrbios de saúde mental nos sobreviventes, tanto casos leves quanto graves. Sintomas como ansiedade, depressão, TEPT e sofrimento geral persistiram além da fase aguda. |
Madeline et al., 2022 | Revisão sistemática | Na população pediátrica a longo prazo, os neonatos hospitalizados apresentaram dificuldades ou recusa em se alimentar. Em crianças mais velhas, sintomas comportamentais incluíram apego, distração, irritabilidade e medo de falar sobre a epidemia. Também houve aumento de afeto, inquietação e frustração, além de piora nos relacionamentos com colegas, raiva, distúrbios do sono e queixas de saúde social. | Um subgrupo de crianças ainda corre risco de desenvolver sintomas graves e de longo prazo. Além disso, houve um impacto no ambiente social de crianças e adolescentes, podendo agravar os resultados fisiológicos, psicológicos, comportamentais e acadêmicos, tanto atuais quanto futuros.
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Ceban et al., 2021 | Revisão sistemática e meta-análise | A análise de 81 estudos revelou que 32% dos indivíduos experimentaram fadiga 12 ou mais semanas após o diagnóstico de COVID-19, e 22% apresentaram comprometimento cognitivo. Além disso, observou-se aumento nos marcadores pró-inflamatórios e comprometimento funcional significativo em alguns pacientes. | Sintomas como fadiga persistente e/ou comprometimento cognitivo e aumento dos marcadores inflamatórios são frequentes após a resolução da COVID-19 aguda. |
Khraisat et al., 2022 | Meta-análise | Em 27 estudos com 9.605 sobreviventes de COVID-19, as prevalências de transtornos psicológicos foram: 20% para TEPT, 22% para ansiedade, 36% para sofrimento psicológico, 21% para depressão e 35% para distúrbios do sono.
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Existem sequelas psicológicas em sobreviventes da COVID-19, tais como TEPT, ansiedade, sofrimento psicológico, depressão e distúrbios do sono. |
Schou et al., 2021 | Revisão sistemática | Após a COVID-19, os déficits psiquiátricos mais comuns foram depressão, ansiedade, TEPT, TOC, psicose e declínio cognitivo. Até 30% dos pacientes tiveram sintomas de depressão e ansiedade, com melhora após 90 dias. O TEPT afetou de 6,5% a 42,8%, e o TOC apareceu em 20% dos casos. Houve aumento de diagnósticos psicóticos e 13% dos pacientes tiveram perda de memória, chegando a 28% após 3 meses. Fadiga e distúrbios do sono também foram frequentes. | Os sobreviventes da Covid-19 podem apresentar déficits psiquiátricos, tais como depressão, ansiedade, TEPT, TOC, psicose e declínio cognitivo. Também foi possível verificar frequentemente a presença de fadiga e distúrbios do sono. |
Shanbehzadeh et al., 2021 | Revisão de Literatura | Esta revisão analisou 34 estudos sobre os efeitos da COVID-19 até 3 meses após a infecção. Os problemas mais comuns foram fadiga (28% a 87%), dor (4,5% a 36%), artralgia (6% a 27%) e declínios na capacidade física e nas atividades diárias (15% a 54%). Também foram frequentes ansiedade (6,5% a 63%), depressão (4% a 31%) e TEPT (12,1% a 46,9%). Mulheres e pacientes em terapia intensiva relataram mais sintomas. A qualidade de vida foi reduzida até 3 meses após a COVID-19. | O estudo destacou que os efeitos da covid-19 podem estar presentes até 3 meses após a infecção, incluindo fadiga, dor, artralgia, declínio na capacidade física e nas atividades diárias, ansiedade, depressão e TEPT, bem como redução da qualidade de vida. |
Fonte: Autores, 2024.
5. DISCUSSÃO
Caracterizada como COVID Longa é uma condição adquirida após a infecção por COVID-19, a qual pode surgir após três meses do contato viral e seus sintomas devem perdurar por pelo menos 2 meses, sem que haja explicação por um outro diagnóstico, assim como trata o jornal Nações Unidas (2021). Dentre seus acometimentos sistêmicos, destacou-se os distúrbios neuropsiquiátricos causados pela infecção viral.
Postulou-se que as causas subjacentes para o desenvolvimento desses distúrbios neuropsiquiátricos incluíram: neuroinflamação com aumento de citocinas inflamatórias IL-6 e TNF induzida pela infecção, estresse psicológico e fatores biológicos, como a desregulação do sistema imunológico, e impacto na função dos neurotransmissores (Mazza, 2023). Além disso, biomarcadores com níveis elevados de CRP e D-dímero foram associados a risco aumentado de sequelas neuropsiquiátricas (Zeng, 2023).
Sobre os fatores de risco, (Zeng, 2023) apontou que os fatores demográficos, como idade avançada e gênero masculino, estão associados a maior risco de desenvolver TEPT e déficits cognitivos, incluindo problemas de concentração e memória. Em contrapartida, os resultados encontrados por (Qiangru, 2023) e (Zakia, 2023) destacaram outros fatores de risco, como ser do sexo feminino, obesidade e presença de comorbidades prévias. Tais condições estão associadas a maior probabilidade de desenvolvimento de sintomas persistentes de COVID Longa, especialmente de sintomas neuropsiquiátricos. Ademais, o estudo de (Qiangru, 2023) cita que nos primeiros seis meses a gravidade inicial da infecção e a hospitalização foram determinantes, mas fatores demográficos (idade e gênero) mostraram impacto crescente ao longo do tempo.
De acordo com o (Bourmistrova, 2022), a ansiedade foi um dos distúrbios psiquiátricos de aparecimento mais precoce e quanto a sua gravidade, (Rehab, 2022) registrou que além de ser uma das complicações mais comuns da COVID Longa, também, foi mais grave em pacientes sobreviventes jovens do que em idosos. Além disso, foi constatado que a frequência da ansiedade desenvolvida nos paciente pós-covid foi semelhante ao da população geral, mas com a positividade do histórico psiquiátrico tal manifestação foi associada a um curso mais grave de COVID Longa, com recuperação mais lenta e piores resultados em comparação a pacientes hígidos tal como trata em (Hovagemyan, 2023). Contudo, autores como (Hend Ibrahim, 2023) e (Mat Hassan, 2023) defenderam a tese que a presença de ansiedade foi até 2 vezes mais significativa em populações com comorbidade psiquiátricas prévias.
Vale destacar que de acordo com o (Schou, 2021), os sintomas de ansiedade tiveram sua melhora após noventa dias do seu início, isso pode ter relação com vários fatores como a presença de hospitalização que pode agravar os sintomas psiquiátricos, segundo (Zürcher, 2022).
A depressão também mostrou ser um problema entre os pacientes, sendo o segundo transtorno psicológico mais frequentemente relatado, com prevalências variando entre 4% a 47,8% (Shanbehzadeh, 2021; Zakia, 2023). Assim como a ansiedade, a depressão esteve associada à maior gravidade da doença com aqueles que enfrentaram formas mais graves da infecção, apresentando taxas mais altas de sintomas depressivos (Deng, 2021). Além disso, pacientes com comorbidades pré-existentes ou com histórico de distúrbios psiquiátricos tiveram um risco aumentado de desenvolverem depressão, com um curso mais grave, após a infecção (Hovagemyan, 2023).
Ainda como desfecho primário, o TEPT apresentou uma prevalência significativa variando de 13% a 42,9% (Zakia, 2023). Além disso, os pacientes com diagnóstico psiquiátrico prévio, do sexo feminino e com fase aguda grave na hospitalização demonstraram uma maior vulnerabilidade ao desenvolvimento de sintomas de TEPT após a infecção (Qiangru, 2023), com persistência durante alguns meses (Shanbehzadeh, 2021).
Os distúrbios do sono também foram frequentemente descritos como sintomas presentes na Covid Longa. (Bourmistrov, 2022) identificaram distúrbios do sono como um dos sintomas mais persistentes entre os sobreviventes de COVID-19, com uma prevalência maior de insônia relatada entre os participantes. Embora os sintomas de insônia fossem mais comuns do que outros problemas de saúde mental, a gravidade foi considerada leve e comparável aos níveis observados na população geral durante a pandemia. Outros autores como (Zakia, 2023), (Khraisat, 2022), (Deng, 2022) e (Seighali, 2024) também citaram a ocorrência desses sintomas em seus estudos, variando de cerca de 4,4 a 50%. Desse modo, verificou-se que a alteração dos padrões normais do sono pode ser um efeito prolongado da Covid Longa, afetando a recuperação completa e, consequentemente, a saúde mental dos pacientes.
Quanto às sequelas neuropsiquiátricas na população pediátrica, Madeline et al. (2022) identificaram disrupção nos sintomas comportamentais em crianças mais velhas, como apego, distração, irritabilidade e medo de falar sobre a pandemia, apontando um padrão anormal de comportamento. Além disso, o autor cita que outras alterações nessa população são frequentes, como o aumento da inquietação e frustração, piora nos relacionamentos com colegas, raiva e distúrbios do sono. Os jovens também apresentaram aumentos em sentimentos de tristeza, irritabilidade e estresse psicológico, intensificados em cenários de confinamento e ensino remoto.
Por último, é fundamental citar que este estudo enfrentou limitações que impactaram os resultados. Primeiramente, o tamanho reduzido da amostra final (19 estudos elegíveis) restringiu a generalização dos achados, o que dificulta a compreensão global da prevalência de transtornos psiquiátricos associados à COVID Longa. A ausência de dados disponíveis ou até mesmo confiáveis em algumas regiões do mundo revelou um viés geográfico, além de que a heterogeneidade das metodologias aplicadas nos estudos limitou a comparação direta dos resultados. Por fim, as condições de hospitalização e evolução particular dos participantes pode não representar de forma fidedigna ou equiparável à população geral de sobreviventes da Covid-19. Apesar das limitações expostas, o estudo evidencia, com dados longitudinais e metodologia padronizada, a necessidade de futuras investigações para explorar melhor a complexa interação entre saúde mental e COVID Longa, possibilitando novas intervenções mais direcionadas e eficazes.
6. CONCLUSÃO
As sequelas mentais e neuropsiquiátricas a longo prazo em sobreviventes da COVID-19 são manifestações frequentes e requerem identificação precoce para melhora da qualidade de vida.
Ansiedade, depressão, TEPT, distúrbios no sono e concentração foram as sequelas mais citadas nos trabalhos. Além disso, foi possível identificar fatores de risco, como sexo feminino, doenças crônicas prévias e idade avançada, refletindo que grupos específicos podem se beneficiar de acompanhamento preventivo.
Esses achados indicam a necessidade de um olhar diferenciado para as pandemias prévias enquanto propostas implementadas anteriormente podem fornecer insights úteis para o manejo da saúde mental dos sobreviventes da COVID-19.
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[1] Graduação em Medicina (em andamento). ORCID: 0009-0004-0940-7381. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8209758168785356.
[2] Orientador. Mestrado em Ciências da Saúde. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5238- 7233. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/9369707567399877.
[3] Graduação em Medicina (em andamento). ORCID: 0009-0009-3463-8831. Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/0771164075577544.
[4] Graduação em Medicina (em andamento). ORCID: 0009-0009-2458-9394. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/4771468646401831.
Material recebido: 13 de janeiro de 2025.
Material aprovado pelos pares: 20 de janeiro de 2025.
Material editado aprovado pelos autores: 20 de fevereiro de 2025.