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A postura reflexiva do docente de língua inglesa como fator de melhoria da práxis pedagógica

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CONTEÚDO

ARTIGO DE REVISÃO

MATOS, Fabienne [1]

MATOS, Fabienne. A postura reflexiva do docente de língua inglesa como fator de melhoria da práxis pedagógica. Revista Científica Multidisciplinar Núcleo do Conhecimento. Ano. 10, Ed. 02, Vol. 01, pp. 113-137. Fevereiro de 2025. ISSN: 2448-0959, Link de acesso: https://www.nucleodoconhecimento.com.br/educacao/postura-reflexiva-do-docente, DOI: 10.32749/nucleodoconhecimento.com.br/educacao/postura-reflexiva-do-docente

RESUMO

Este artigo trata-se de uma revisão bibliográfica que pretende expor a importância da atitude reflexiva do docente de Língua Inglesa (LI) para o processo de desenvolvimento da prática de ensino, tanto quanto a sua relevante contribuição para uma aprendizagem significativa. Nessa investigação, explicitaremos o perfil ideal do professor de LI e a relevância de seus conhecimentos sobre abordagem comunicativa de língua; discutiremos as mudanças advindas com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), bem como mostraremos o quanto a valorização da docência constitui elemento preponderante para que o educador atinja o mais alto nível de capacidade crítico-reflexiva.

Palavras-chave: Perfil do professor, Atitude reflexiva, Base Nacional Comum Curricular, Abordagem comunicativa, Valorização da docência.

1. INTRODUÇÃO

A postura reflexiva constitui um grande alicerce no desenvolvimento da prática de ensino. Refletir sobre a prática requer conhecimentos, habilidades, tempo para análises e interpretações, atitudes, bem como a integração e valorização dos personagens formadores do processo de ensino-aprendizagem.  Este artigo tem por objetivo destacar a importância da postura reflexiva do docente de Língua Inglesa (LI) no processo de desenvolvimento de sua prática de ensino. Iniciaremos a nossa metodologia de pesquisa com uma breve explanação sobre o perfil ideal do professor de LI; destacaremos a relevância dos seus conhecimentos e da postura reflexiva para atender as exigências da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) com relação à disciplina Língua Estrangeira (LE), tanto quanto na perspectiva da Abordagem Comunicativa; e o seu papel transformador da realidade do ensino de línguas. Em seguida, argumentaremos sobre a valorização do docente como meio catalisador para o desenvolvimento da ação-reflexiva do professor. Para isso, tomaremos como base as elucidações de alguns teóricos para fundamentar este trabalho, tais como: Alarcão (2002), Almeida Filho (2007; apud Dutra; Mello, 2004), Barcelos (2006; 2007), Bartlett (apud Dutra; Mello, 2004), Braz; Alves (2013), Cunha (1989), Freire (1996), Luckesi (1994), Mckay (2003), Moita Lopes (1996), Morales (1999), Neves (1996), Nóvoa (1997), Paiva (1997) e Tapia; Fita (1999). Além disso, três documentos importantes serão utilizados como arcabouço teórico: a BNCC, o Documento Curricular do Território Maranhense para Educação Infantil e o Ensino Fundamental e a pesquisa realizada pelo British Council. Enfim, visamos a contribuir significativamente para compreensão e necessidade da postura reflexiva no desenvolvimento da prática de ensino de LI e da importância dessa atitude no progresso profissional do docente.

2. O PERFIL IDEAL DO PROFESSOR DE LÍNGUA INGLESA

Com o surgimento do ensino comunicativo de Língua Estrangeira (LE) na década de 70, iniciou-se um ciclo de mudanças na prática de ensino de Língua Inglesa (LI), que passou a exigir um novo perfil do professor de idiomas.

Não sendo mais visto como o transmissor de conhecimento, e sim como facilitador do aprendizado de línguas, novas características passaram a ser atribuídas à figura do docente de LI.  De acordo com Paiva (1997) essas são as seguintes características: a consciência política, conhecimento específico sobre o idioma e uma boa formação pedagógica.

O professor de idiomas precisa de uma consciência política que direcione a sua prática de ensino. É através da compreensão da sociedade e dos grupos de alunos para os quais as suas aulas estão destinadas, que o professor conduz a sua ação, determinando metas de aprendizado e métodos de ensino mais relevantes ao seu contexto.

Com a complexificação da sociedade e a globalização, o instrutor de línguas não está limitado a apenas ensinar vocabulários, estruturas e funções linguísticas, e aspectos gramaticais. Cabe, agora, ao educador, utilizar-se do idioma como meio de reprodução, transformação e intervenção na sociedade, contudo, não o restringindo somente ao contexto escolar, mas oportunizando aos alunos a possibilidade de intervenção no mundo, formando discentes mais críticos e conscientes. Essa concepção de ensino de LI está descrita na Base Nacional Comum Curricular[2] (BNCC), que prioriza o foco da função social e política do inglês.

Dessa forma, os estudantes terão acesso a uma dimensão inter e multicultural, que lhes garantirá um amplo letramento construído por meio de estratégias que lhes possibilitarão fazer conexões com universos diferentes do seu, de forma engajada, crítica e reflexiva (Maranhão, 2019, p. 273).

Além disso, o docente de LI deve conhecer bem o campo científico em que atua, ou seja, o “[…] educador deve possuir conhecimentos e habilidades suficientes para poder auxiliar o educando no processo de elevação cultural” (Luckesi, 1994, p.115). Isso implica dizer que o educador necessita de competência linguístico-comunicativa, isto é, deve saber usar a língua-alvo para fins comunicativos, de modo que envolva os alunos nas mais diversas formas de linguagem, pois:

[…] a BNCC afirma que as atividades feitas pelos educandos devem envolver situações de comunicação real, em que o uso da língua alvo seja feito de forma significativa. Nesta proposição de ensino de línguas, o foco é, portanto, o significado por meio de interações dialógicas, em que o desafio do professor deve ser criar condições para que essas interações ocorram de forma a instituir situações significativas para o desenvolvimento das competências específicas deste componente curricular […] (Maranhão, 2019, p.275).

Para atender a essa orientação, a BNCC sugere ao educador:

[…] prática de estudos em situações de ampla exploração de variados recursos, destacando a eficiência dos multimodais, visto que as imagens fazem parte do cotidiano da comunicação na sociedade atual como instrumentos facilitadores dos processos de comunicação (Maranhão, 2019, p.274).

Sendo assim, deve-se também destacar a importância da formação pedagógica. O professor de LI deve ter conhecimento das mais diversas formas de linguagens, abordagens, métodos, estratégias de ensino e atividades; conhecer diferentes processos e teorias de aprendizagem para garantir uma aprendizagem que vá muito mais além do desenvolvimento intelectual. Munido desse conhecimento, o educador será capaz de desenvolver o seu trabalho de forma interessante e significativa, adaptando a sua práxis pedagógica às diferentes formas de aprender; será capaz de refletir sobre quais recursos e técnicas, quais atividades serão ideais para provocar segurança e motivação, de modo a respeitar particularidades, necessidades e dificuldades, mas, sobretudo, potencializar as habilidades dos discentes, tanto quanto contribuir para uma proposta pedagógica mais inclusiva. Portanto, uma formação pedagógica adequada contribui para o desenvolvimento de capacidade criativo- reflexiva, pois o professor, com esses subsídios pedagógicos, terá condições de driblar as condições insuficiente de ensino de LE nos ambientes escolares brasileiros, além de colaborar para o processo de formação integral, ou seja, formação intelectual, física, social, emocional, política e cultural do indivíduo.

Enfim, como profissional da educação, o professor de LI precisa estar sempre atualizado e em constante processo de reflexão para, assim, realizar o seu papel de mediador da cultura elaborada de maneira adequada e eficiente que possibilite a formação e o desenvolvimento de habilidades e competências dos alunos.

3. A BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR E A POSTURA REFLEXIVA DO PROFESSOR DE LÍNGUA INGLESA

Publicada em 2017, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) é um documento normativo, que elenca uma série de aprendizagens essenciais que alunos da educação básica devem aprender. O objetivo principal desse documento, além de nortear as instituições de ensino de todo o país, é reduzir as desigualdades de aprendizado, através da organização de uma base curricular comum e outra diversificada.

A partir dessa Base, percebe-se uma nova visão de ensino de LI em razão do atual contexto da sociedade brasileira. Consequentemente, uma nova postura de professor passa a ser requerida, com novos procedimentos e estratégias de ensino que garantem o pleno desenvolvimento do educando.

Primeiramente, a BNCC modificou a situação da LI do status de LE para língua franca, dizendo:

[…] a língua não é mais aquela do “estrangeiro”, oriundo de países hegemônicos cujos falantes servem de modelo a ser seguindo, nem tampouco trata-se de uma variante da língua inglesa. Nessa perspectiva, são acolhidos e legitimados os usos que dela fazem falantes espalhados no mundo inteiro, com diferentes repertórios linguísticos e culturais, o que possibilita, por exemplo, questionar a visão de que o único inglês “correto” – e a ser ensinado –  é a aquele falado por estadunidenses ou britânicos (Brasil, 2017, p. 241).

Esse novo status traz consigo uma nova forma de ver e conceber a língua, entendendo-a não mais como o idioma somente dos falantes nativos de países hegemônicos, cuja fala servia de modelo a ser seguido, mas como idioma usado por diferentes pessoas em diferentes contextos sociais.

Desse modo, o idioma é reconhecido como via de acesso às diversidades culturais e às variações linguísticas das comunidades que o usam, seja como língua nativa ou não, assim como meio de acesso ao mundo acadêmico e mercadológico. Contribuindo também para o entendimento e respeito das diversas formas de expressão, de manifestações culturais, das crenças, modos e estilos de vida de várias nações.

Para tal, o educador não precisa mais escolher entre ensinar o inglês americano ou o britânico. Ele necessita considerar os diferentes repertórios linguísticos das mais variadas comunidades que o utilizam para se comunicar. Desta forma, o profissional da educação estará possibilitando e estreitando a ponte de acesso do aprendiz aos diferentes contextos socioculturais, cooperando para o exercício da cidadania e superação de preconceitos.

Nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais), as práticas comunicativas de leitura, interpretação de texto e escrita com foco em aspectos gramaticais eram enfatizadas. Na BNCC, essas práticas não só são reconsideradas no desenvolvimento de competências linguísticas, como também servem de meio para o desenvolvimento de competências discursivas, através de atividades que promovam a interação do leitor com o texto escrito, isto é, atividades com enfoque “[…] na construção de significados pela exploração dos gêneros escritos na língua inglesa e que circulam nos diversos campos e esferas da sociedade” (Maranhão, 2019, p. 278), integradas à produção textual (individual ou coletivo/colaborativo).

Por conseguinte, o profissional da educação deverá promover espaços para o estudante pesquisar, argumentar, debater e expressar opiniões e posicionar-se criticamente sobre as temáticas dos textos lidos, e não somente retirar resposta prontas dos mesmos. Aliás, propõe o exercício da leitura de diferentes gêneros textuais (verbais, verbo-visuais e multimodais) que induzem à reflexão sobre as transformações sociais e tecnológicas e o entendimento de que essas mudanças contribuem para a variação e ampliação das diversas maneiras de se compartilhar conhecimento tanto quanto produzi-lo, corroborando também com o caráter formativo do educando, através de uma visão de multiletramento[3] do aluno. Em vista disso, espera-se que as competências linguísticas possam se articular com outras habilidades: escrita, fala e escuta.

Ao desenvolver as estruturas gramaticais, a BNCC sugere ao mestre que essas sejam desenvolvidas de modo contextualizado e articulado, não devendo ser usadas exclusivamente para as práticas de leitura, mas também usadas quando das tarefas orais e escritas, por acreditar que situações reais e autênticas de aprendizado ajudam a despertar a análise e a reflexão do aluno sobre o funcionamento da LI.

Nessa perspectiva, os estudantes deverão ser encorajados a pensar, de modo curioso e investigativo, sobre o funcionamento da língua inglesa e descobrir como o sistema funciona, sem padronizar um modo de expressão como “certo” ou “errado” (Maranhão, 2019, p.278).

Com isso, o docente será impulsionado a adotar novas estratégias, procedimentos e abordagens de ensino dos conhecimentos linguístico que não sejam mais aquelas intermináveis aulas expositivas de regras gramaticais, com traduções e exemplificações completamente isoladas do contexto escolar e social do discente.

Além do mais, o documento compreende a importância da linguagem oral, enfatizando o processo de compreensão (escuta) e de produção oral em contextos sociais distintos; admitindo também que o sujeito aprende em ações reais de comunicação. Em vista disso, é primordial que o mestre ofereça condições espontâneas de comunicação oral mediante simulações, dramatizações, diálogos, debates, conversas e entrevistas com suporte ou não de diferentes plataformas digitais, promovendo quando for possível, interações do aprendiz não, só com o corpo social do qual faz parte, mas também com indivíduos de comunidades diversas.

Ademais, a Base incentiva o uso de recursos digitais, não somente como mero mecanismo de acesso ao conhecimento, mas como instrumento pela qual o próprio conhecimento é construído. Portanto, o docente deverá ser capaz de superar o uso das novas tecnologias apenas como suporte ou meio didático, criando novas formas de relacionamento entre o aluno e o conhecimento, como por exemplo, trabalhar os Greetings (good morning, good afternoon…), por meio da produção de stickers, ou seja, fazer o sujeito usar as novas tecnologias “com novas linguagens e modos de interação, para pesquisar, selecionar, compartilhar, posicionar-se e produzir sentidos em práticas de letramento na língua inglesa, de forma ética, crítica e responsável” (Brasil, 2017, p. 246).

Com base no que foi dito, destaca-se o quanto é importante o contínuo comportamento reflexivo do educador. O ensino-aprendizagem de um idioma não limita-se apenas ao estudo do léxico e de estruturas gramaticais. A língua é dinâmica e está sempre em evolução e transformação, pois ela traz consigo elementos que resultam das influências socioculturais, políticas e econômicas dos contextos sociais de seus falantes.

Portanto, para garantirmos o acesso ao conhecimento construído e garantir o desenvolvimento de habilidades e competências esperado pela BNCC, é necessário que o professor esteja em constante reflexão para que ele perceba o mundo ao seu redor e, a partir dele, seja capaz de fazer as escolhas de conteúdo, das práticas pedagógicas, metodológicas e didáticas mais pertinentes, permitindo que o indivíduo se aproprie, interaja, atue e transforme a sociedade da qual faz parte.

4. A IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR EM CONHECER A MATÉRIA QUE ENSINA

Conhecer diferentes metodologias, procedimentos, técnicas, atividades e formas de avaliação, sem ter conhecimento da matéria que ensina, não são as condições necessárias, pelo menos isoladamente, para desenvolver um bom processo de ensino-aprendizagem.

No mínimo, para ensinar, deve-se conhecer a matéria que ensina, saber os tópicos básicos da disciplina, a sua estrutura, como ela evoluiu ou evolui, para que, assim, seja capaz de relacioná-la a outras ciências e a assuntos da atualidade com o propósito de torná-la significativa ao estudante. Estas são a condições essenciais para ensinar, pois “[…] conhecer a fundo a matéria que ensinamos e vibrar com ela é indispensável para comunicar aos alunos a motivação que se costuma considerar mais valiosa do ponto de vista pedagógico: a motivação intrínseca” (Tapia; Fita, 1999, p. 91).

Se o professor não sabe o que ensina, pouca motivação terá ao ensinar. Como resultado disso, os alunos também não encontrarão prazer em aprender a matéria, pois “[…] a disponibilidade, o interesse etc. têm de ser comunicados aos alunos. E tal comunicação afeta a percepção que eles têm do professor e, consequentemente, exerce influência sobre sua dedicação às tarefas de aprendizado” (Morales, 1999, p.60, grifo do autor). Portanto, é de fundamental relevância que o educador tenha um amplo conhecimento linguístico como primeiro passo para despertar o interesse dos aprendizes pela LI.

O mundo está sempre em evolução, o que acarreta o surgimento de novos conhecimentos, dos quais os professores devem se apropriar, pois, caso contrário, nossas ideias já estarão petrificadas e superadas. “O professor que tem domínio do conteúdo é aquele que trabalha com dúvida, que analisa a estrutura de sua matéria de ensino e é profundamente estudioso naquilo que lhe diz respeito” (Cunha, 1989, p. 143). Portanto, é de suma importância nos aperfeiçoarmos constantemente, a fim de interagirmos com temas atuais pertinentes de grande valor social e pessoal aos educandos.

A determinação do significado de uma atividade depende ao menos de dois fatores: de um lado, do grau em que o aluno é capaz de situar a tarefa no contexto do que já sabe e, do outro, do grau em que é capaz de determinar as implicações futuras de sua realização (Tapia; Fita, 1999, p. 41).

No ensino de LI, essa tarefa é de grande relevância. Se o professor não der condições para que o discente contextualize a matéria e, ao mesmo tempo, perceba a sua importância para sua vida prática, terá pouco interesse em aprendê-la. A própria BNCC (BRASIL, 2017, p. 246) ressalta o valor dessa percepção para o desenvolvimento de competências, pois o indivíduo torna-se capaz de identificar o seu papel e o do outro em uma sociedade plurilíngue e multicultural, refletindo, criticamente, sobre o quanto a LI pode contribuir para sua inserção no mundo globalizado, no mercado de trabalho, tanto quanto contribuir para o exercício da cidadania.

Portanto, para que o aluno tome interesse pela matéria que estuda e desenvolva habilidades e competências[4] na LI, depende muito dos esforços do professor em contextualizá-la e torná-la significativa na vida desses alunos, mas, para que isso aconteça, o profissional da educação precisa, primeiramente, conhecer profundamente o objeto que ensina.

5. O PROFESSOR REFLEXIVO E A ABORDAGEM COMUNICATIVA

O ensino comunicativo de línguas surgiu em 1970 em contraposição aos métodos que tinham como enfoque central a memorização de palavras e regras gramaticais, a prática repetitiva, a tradução de estruturas da língua e de textos literários. Acreditava-se nessa época que o desenvolvimento de habilidades linguísticas não englobava apenas o estudo de estruturas gramaticais e vocabular do idioma, mas também as funções comunicativas com foco em habilidades.

Porém, apesar das mudanças de abordagens de ensino de LE, que resultaram no desenvolvimento de atividades, materiais didáticos e programas de estudo que atendessem esse novo modelo de ensino, tanto quanto contribuíram para o surgimento de vários métodos comunicativos, dentre os quais podemos destacar: Aprendizado Comunitário de Língua, Suggestopedia, Silent Way, Total Physical Response e Abordagem Natural; mudanças que culminaram mais tarde no que se convencionou chamar de Abordagem Comunicativa (AC). No Brasil, essa nova perspectiva de ensino de LE não provocou modificações substanciais nas abordagens de ensino do professor e tampouco garantiu a boa proficiência dos alunos.

Segundo Neves (1996), essa realidade é proveniente das razões listadas abaixo:

– Os professores ainda não compreenderam os pressupostos teóricos da AC, apesar de usar os materiais didáticos dentro dessa abordagem de ensino;

– As metodologias dos professores são fortemente influenciadas por abordagens de ensino que priorizam competências gramaticais ou linguísticas, ou seja, abordagens que focam em regras gramaticais e vocabulários, em detrimento das que priorizam as competências comunicativas, as quais fazem uso da língua em situações reais de comunicação;

– O professor ainda exerce o papel autoritário e disciplinador, desconsiderando as diferentes formas de aprender, consequentemente, contribuindo para uma postura passiva dos alunos.

Com base no que foi dito, destaca-se a importância do conhecimento sobre os pressupostos teóricos da AC para o progresso do ensino de LE no Brasil, bem como contribuir para o despertar de uma postura reflexiva do professor. Então, resta-se responder a seguinte pergunta: o que é a Abordagem Comunicativa de Língua?

Segundo Almeida Filho (2007), o ensino comunicativo de línguas é:

[…] aquele que organiza as experiências de aprender em termos de atividades relevantes/ tarefas de real interesse e/ ou da necessidade do aluno para que ele se capacite a usar a língua alvo para realizar ações de verdade na interação com outros falantes – usuários dessa língua (2007, p.36).

Neves (1996) destaca a principais características da AC. Veja:

– Ensino contextualizado da língua baseado em tarefas;

– Alunos autônomos e responsáveis pelo seu processo de aprendizagem;

– O aprendiz é usuário ativo e criativo da língua e deve ser visto como ser integrante de um ambiente social, ambiente esse em que ele interage de forma autônoma com o grupo de pessoas com as quais se relaciona;

– O professor e o aluno são sujeitos ativos, criativos e co-comunicadores. Juntos, eles constroem o processo de ensino e aprendizagem, através de um programa de ensino baseado na negociação;

– O professor deixa de ser autoritário e passa a ser orientador;

– As avaliações de aprendizagem devem acontecer sempre de forma contextualizada, podendo haver quesitos que envolvam tanto respostas restritas quanto integrativas, desde que se respeite o nível de proficiência do discente no desenvolvimento de uma determinada tarefa.

Quanto ao material didático, este deve refletir a AC. Neves (1996) diz que:

[…] deverá se compor dos paradigmas estrutural/nocional-funcional/situacional e levar em consideração as necessidades dos alunos, proporcionando atividades que explorem suas estratégias de aprendizagem e comunicação (1996, p. 74).

Então, desenvolver aulas dentro da perspectiva da AC requer uma visão crítica e contínua sobre a prática de ensino. Pois, o professor de LE está diante de diversos métodos comunicativos, que se propõem a estabelecer o contato direto, significativo e interativo entre o sujeito que aprende e o objeto que se estuda, nesse caso, a LI.

Os métodos comunicativos não são de um único tipo. Frequentemente se apresentam ora como métodos com foco na forma (gramatical) e comunicativizados, ora como incentivadores de uma prática de linguagem sem que ela implique temas e tópicos educacionalmente construtivos ou conflitantes, ora como comunicativos progressistas, incluindo atividades de autoconhecimento, interação verdadeira sobre tópicos reais e ideologicamente conflitivos. É constitutivo de um método comunicativo, ainda, a providência de oferecer situações de aprendizagem não defensiva em ambientes o menos tensos possível (Almeida Filho, 2007, p. 36).

Eis o desafio do professor: escolher e refletir sobre técnicas, procedimentos, recursos, atividades e formas de avaliação mais pertinentes ao público de estudantes, de modo que, tanto o docente quanto o discente, se desenvolvam nesse processo de ensino-aprendizagem, pois, quanto maior for a capacidade de reflexão do docente, mais consciente estará de sua prática. Aprofundar o nível de questionamento é fundamental, pois “é pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática” (Freire, 1996, p. 43-44).

Devido à heterogeneidade das turmas, os contextos educacionais constituem em ambientes complexos e desafiadores. Nem sempre é possível desenvolver uma mesma prática em diferentes turmas. Cada grupo de alunos pode exigir uma prática diferente. Assim sendo, o docente precisa estar capacitado para analisar e escolher qual é a melhor maneira de ensinar. Mas como tornar isso possível?

Alguns autores mencionam que o professor precisa alcançar níveis eficazes de reflexão. Contudo, isso não acontece de uma hora para a outra. Segundo Bartlett (1990 apud Dutra; Mello, 2004, p.32), o professor de LI precisa passar por cinco fases de elevação reflexiva, as quais ele chama de não-lineares ou sequenciais: “[…] mapear, informar, contestar, avaliar e agir”. Alcançando esses graus de reflexão, o professor torna-se o responsável pela sua própria formação profissional tanto quanto responsável pelas ações geradoras de mudanças da práxis pedagógica.

Segundo Almeida Filho (1999 apud Dutra; Mello, 2004, p.32, grifo do autor), a “[…] reflexão passa a ser um catalisador para o desenvolvimento das competências implícitas: linguístico-comunicativa, teórica, aplicada e profissional[5]’’. Com essas competências, o docente será capaz de reconhecer seu papel social e a necessidade de ampliar conhecimentos acerca dos métodos e das abordagens comunicativas, assumindo dessa forma uma postura sincrética[6].

Tendo conhecimento da AC, o docente de LI é consciente de que é necessário promover não só a competência gramatical dos alunos acerca do idioma, mas também favorecer o desenvolvimento de outras habilidades, tais como: ler, escrever, ouvir e comunicar-se através da LE.

Assim sendo, faz-se necessário estabelecer a relação entre a prática reflexiva e a abordagem comunicativa. Segundo Almeida Filho (2004), a reflexão deve estar associada ao comunicativismo:

[…] o reflexismo não faz parte intrínseca do comunicativismo enquanto movimento teórico-prático no âmbito do ensino-aprendizagem de línguas, mas é produtivamente articulável com ele e essa relação precisamos explorar com verticalidade na profissão e na linguística aplicada (2004, p.11).

Sendo o professor de LI um ser reflexivo, este estará apto para perceber traços distintos de aprendizagem, adaptando-se, assim, a sua abordagem de ensinar às diversas formas de aprender, através da seleção de itens linguísticos, léxicos, semânticos e discursivos de real necessidade do aluno, a fim de que ele estabeleça a interação social por meio da LI.

Logo, não basta apenas o professor de LI ser comunicativo, ou seja, aquele que cria possibilidades para que alunos interajam socialmente através do idioma estrangeiro, mas também precisa ser reflexivo, o que segundo Alarcão (2002), é:

[…] aquele que pensa no que faz, que é comprometido com a profissão e se sente autônomo, capaz de tomar decisões, e ter opiniões. Ele é, sobretudo, aquele que atende aos contextos em que trabalha, os interpreta e adapta a própria atuação a eles (2002).

6. O PROFESSOR COMO SER REFLEXIVO E TRANSFORMADOR

Como já foi mencionado anteriormente, o professor reflexivo é aquele que é comprometido com sua profissão e sempre tomará decisões antes, durante e/ou após suas aulas.

Essa capacidade reflexiva leva o profissional da educação à constante investigação sobre os problemas em sala de aula, visto que muitas de suas indagações são resultantes deles. Na medida em que identifica os problemas, o professor reflexivo coleta informações e as analisa. Essas análises darão ao docente condições de lidar e de resolver tais problemas.

Por essa razão, a atitude reflexiva contribui para o desenvolvimento da práxis pedagógica. De acordo com Mckay (2003, p. 8-9), algumas dessas contribuições são as seguintes:

– A atitude reflexiva liberta o docente do comportamento rotineiro – o professor deixa de seguir o roteiro de um livro ou de aplicar a sua aula tal qual ele presenciou no passado. Como resultado disso, as aulas costumam ser mais criativas e eficientes.

– A atitude reflexiva capacita o docente a agir de maneira deliberada – ou seja, o professor ensina de uma maneira ou de outra as suas lições, baseado em razões específicas. Por exemplo: se os alunos têm dificuldade de estabelecer a diferença entre o uso do Simple Past e Present Perfect, o professor buscará estratégias, procedimentos e atividades, que facilitarão a compreensão dessas estruturas verbais.

– A atitude reflexiva melhora a prática de ensino, pois o docente, sendo consciente das diversas formas de aprender do aluno, leva em consideração as diversas maneiras de ensinar uma lição específica. Ao escolher uma maneira de abordar uma informação, ele toma como norteadores de sua práxis, fatores como o nível de proficiência dos alunos, suas necessidades e interesses, bem como os objetivos do currículo de ensino, recursos disponíveis e tempo de realização de uma tarefa.

Tal qual como precisamos comer, respirar, a educação necessita de professores reflexivos. Morales (1999) destaca a importância de refletirmos sobre como nos vemos e definimos o nosso papel de professor. A maneira como nos enxergamos e definimos as nossas obrigações têm reflexos em tudo que realizamos em sala de aula, desde a correção de um erro ou de um simples cumprimento ao aluno.

Também destacamos a importância do educador em reconhecer algumas de suas crenças, pois elas podem influenciar a sua práxis pedagógica. Isto porque, segundo Barcelos (2007, p.112), “[…] a compreensão das crenças dos professores ajuda a entender não somente suas escolhas e decisões, mas também a divergência entre a teoria e a prática, e entre as crenças de formadores de professores e de professores”, ou seja, as crenças vão se perpetuando, influenciando significativamente as ações, o comportamento, as escolhas das estratégias, métodos e abordagens de ensino, culminando na discrepância entre aquilo que se sabe teoricamente e o que se faz na prática; e na relação professor-aluno, favorecendo ou não um diálogo amistoso entre ambos.

Dada a sua relevância, o que são as crenças? De acordo com Barcelos (2007), as crenças são:

[…] uma forma de pensamento, construções da realidade, maneira de ver e perceber o mundo e seus fenômenos, co-construídas em nossas experiências resultantes de um processo interativo de interpretação e (re)significação. Como tal, crenças são sociais (mas também individuais), dinâmicas, contextuais e paradoxais (2007, p.113).

Agora, baseado em Moita Lopes (1996), citaremos alguns exemplos de crenças no ensino de LE mais comuns no contexto brasileiro, dentre elas, podemos destacar as seguintes:

– As crianças têm mais facilidade de aprender LE do que o adulto;

– Para ensinar uma LE é necessário ensinar as quatro habilidades;

– O ensino de LE deve estar sempre atrelado a um componente cultural;

– Tradução não é necessário;

– O uso da Língua Nativa (LN) prejudica o aprendizado da LE;

– O aluno precisa pensar na LE;

– Aprender LE requer um nível intelectual maior do aluno;

– Os alunos não sabem português quanto mais inglês;

– Os elementos que caracterizam a competência comunicativa são mais relevantes do que os da competência linguística;

– Os conteúdos linguísticos escolhidos no processo de ensino de língua são os que definem o enfoque comunicativo.

Essas são algumas crenças que envolvem o ensino de LE, mas certamente há outras. Isto posto, é de fundamental importância que o educador identifique suas crenças e, principalmente, analise-as reflexivamente para entender e perceber o quanto elas podem estar prejudicando ou não o seu ato de ensinar, visto que elas são capazes de explicar os motivos pelos quais transmitimos um determinado conhecimento.

Assim, é imprescindível a postura reflexiva do docente sobre suas crenças. Barcelos (2006) afirma a relevância de momentos que fomentam a atitude reflexiva para tomada de consciência sobre as crenças de modo a possibilitar um possível questionamento sobre elas.

A maneira de ensinar pode influenciar positiva ou negativamente nossos alunos, pois, segundo Morales (1999, p. 39):

[…] a influência não se dá apenas na linha dos conhecimentos e do desenvolvimento intelectual; incide também no desenvolvimento emocional e social dos alunos. Podemos influir também no desenvolvimento moral, no discernimento dos próprios valores e no discernimento para saber o que eles querem fazer com suas vidas.

Portanto, a conduta, as atitudes, o modo de ensinar, a maneira como o professor enxerga e define as suas obrigações exercem influência na percepção que os alunos têm com relação ao próprio docente e na sua própria motivação. Se os alunos percebem que o professor não tem interesse por aquilo que ensina, não se preocupa com o seu desenvolvimento e desempenho em sala de aula, pouco se dedicará em participar das tarefas de aprendizado.

Isso acaba virando um círculo vicioso, pois na medida em que os educandos demonstram menos interesse por aquilo que está sendo desenvolvido no espaço de aprendizagem, menor será a dedicação do professor, pois os efeitos da relação professor/aluno são recíprocos.

É nesse ponto que se destaca a grande dificuldade do docente de LI em conseguir despertar o interesse pelo idioma, visto que são muitos fatores que influenciam nesse processo, como por exemplo, a falta de material significativo, pois,  geralmente, são inadequados ao real nível e realidade dos estudantes; a escassez de recursos didáticos e de uma proposta de ensino nas escolas regulares que privilegie o estudo do idioma dentro das quatro habilidades: reading (leitura), speaking (fala), writing (escrita) e listening (audição); a supervalorização da quantidade de conteúdos trabalhados em detrimento da qualidade do processo de ensino; e de sua relevância social, política, cultural e, sobretudo, de interesse pessoal  do alunado.

Contudo, os professores não devem desanimar diante dessa situação. Deve-se dialogar com ela e refletir sobre as necessidades e prioridades dos nossos discentes. Grande parte daquilo que podemos fazer pela educação está em nossas mãos.

Isso porque, Morales (1999), os docentes atuam em três áreas, que exigem muito mais do nosso poder, conhecimento e habilidade. A primeira que podemos destacar é a área das relações interpessoais. Uma relação de boa qualidade entre professores e alunos depende da capacidade do docente em expressar interesse e afeto pelo aluno. Devemos ser sinceros e fazer elogios sempre que for necessário, uma vez que, ao agirmos desse modo, só estamos ampliando as relações com os nossos alunos e tornando-as cada vez mais agradáveis e profícuas.

A segunda, diz respeito à estrutura do aprendizado. Esta área corresponde à organização do docente em sistematizar as informações, as tarefas de sala de aula, de modo que atenda ao nível e às expectativas do estudante. E, por último, destacaremos o apoio à autonomia. O apoio ao desenvolvimento da autonomia corresponde à liberdade dada ao aluno na realização das tarefas de sala. Dependendo do tipo de tarefa que realizamos podemos ensinar os alunos a aprender, a pensar, a criar estratégias de aprendizado, a cooperar; podemos ensinar a respeitar uns aos outros e a desenvolver habilidades que antes eram desconhecidas.

Destarte, mesmo com tantas dificuldades, mas agindo reflexivamente, podemos tornar o ensino de LI mais agradável para os nossos alunos, basta um pouco de boa vontade e de amor pela profissão.

7. A PRÁTICA REFLEXIVA E A VALORIZAÇÃO DO DOCENTE NA SOCIEDADE BRASILEIRA

Já comentamos sobre a real importância do professor reflexivo no processo de ensino-aprendizagem de LI. A formação do professor, o conhecimento que ele tem sobre técnicas, métodos e abordagens de ensino comunicativo também são de total relevância nesse processo. É na reflexão crítica acerca da abordagem comunicativa que o docente pode analisar e interpretar sua prática de ensino, promovendo assim ação e mudanças na maneira de ensinar.

Contudo, o professor reflexivo e comunicativo necessita de um sistema educacional reflexivo, que atenda às reivindicações de sua classe, ou seja, não basta apenas o educador ter uma boa e contínua formação, é necessário também que ele tenha bons salários e boas condições de ensino, porém, essa não é a realidade das escolas públicas brasileiras.

De acordo com o estudo “O Ensino de Inglês na Educação Pública Brasileira”, elaborado pelo Plano CDE[7] para o British Council[8], que procurou compreender o contexto de ensino de inglês no Brasil, constatou-se que o professor da rede pública de ensino ganha em torno de R$ 15,00 por hora-aula. Em contrapartida, o da rede privada recebe, em média, R$ 26,00. Esses valores não levam em consideração as horas de planejamento de aulas, tampouco o tempo gasto com correções de atividades, provas e trabalhos.

“É difícil refletir no Brasil por causa dos salários baixos, que obrigam os docentes a ter mais de um emprego” (Alarcão, 2002). Em função disso, muitos professores têm uma sobrecarga de trabalho exaustiva, não criam uma identidade com a escola na qual trabalham e pouco desenvolvem trabalhos em equipe e interdisciplinares. Sendo assim, a capacidade reflexiva dos nossos docentes ficará prejudicada.

Segundo Nóvoa (1997, p. 26), “[…] a troca de experiências e a partilha de saberes consolidam espaços de formação mútua, nos quais cada professor é chamado a desempenhar, simultaneamente, o papel de formador e formando’’. Entretanto, as condições de trabalho do professor de LI não são favoráveis à ação reflexiva do docente, pois, é na dinâmica entre o conhecimento teórico, técnico e procedimental, e na interação com outros grupos constituidores do processo de ensino e aprendizagem que o docente se torna capaz de agir em situações inusitadas e conflitantes em sala de aula.

Além disso, a escola pública brasileira pouco dispõe de recursos para que se desenvolva o ensino comunicativo de LI. Certamente, esse é um dos grandes obstáculos do professor de LI. De acordo com o estudo citado, 81% dos professores de inglês do Brasil afirmam que a maior dificuldade enfrentada por esses profissionais é a escassez de recursos didáticos, tais como, livros didáticos e paradidáticos, dicionários, revistas e jogos; e, principalmente, de equipamentos tecnológicos.

Na opinião desses docentes, o inglês é uma disciplina que requer mais atividades lúdicas, coletivas e interativas para gerar engajamento dos alunos e envolvimento prático com a língua. Por isso, os recursos didáticos, especialmente, os tecnológicos, são a principal demanda dos professores (British Council, 2015, p.15).

Ainda segundo o estudo, o livro didático corresponde a 44% dos materiais disponíveis em sala de aula. Porém, 42% dos educadores relatam que esse material é mais avançado do que o real nível de conhecimento dos discentes no idioma. Por esse motivo, muitos deles não acreditam na eficiência motivadora desse recurso, usando-o apenas como complemento de ensino.

“Os professores percebem que a tecnologia é uma ferramenta fundamental para o processo pedagógico e que os recursos tecnológicos e interativos ajudam a manter a atenção e a motivação dos alunos. Porém, grande parte não tem acesso a estes recursos” (British Council, 2015, p.17). Como alternativa, 61% utilizam seus próprios equipamentos tecnológicos e/ou produzem seus materiais usando, frequentemente, parte de seu salário para a confecção de jogos e atividades.

Os professores se esforçam para levar para a sala de aula materiais didáticos e dinâmicas inovadoras. Geralmente conseguem trazer estas inovações para o ensino a partir da sua rede de relações pessoais e das experiências a que têm acesso em outras escolas (British Council, 2015, p.17).

Diante desse cenário, o profissional de LI se encontra em uma situação de extrema limitação de recursos, consequentemente, terá dificuldade de pôr em prática todo o conhecimento adquirido, que o capacita a dar condições de motivar, estimular e desenvolver as habilidades e competências necessárias nos alunos. Ainda no que tange à pesquisa, os recursos mais valorizados pelos alunos são: músicas (50%), acesso à internet (41%), projetor de slides (40%), computador (31%) e aparelho de som (20%). Esses são os elementos que mais motivam os alunos, porém são os que menos o professor tem acesso.

Pode-se afirmar que as condições precárias de ensino, “[…] o baixo reconhecimento do seu trabalho e a baixa remuneração são as principais razões de descontentamento dos profissionais da rede pública” (British Council, 2015, p. 25). A falta de políticas educacionais que valorizem a condição pessoal e de trabalho do professor interferem no seu desempenho, afetam sua autoestima e seu poder criativo.

Contudo, mesmo diante dessa realidade de ensino, muitos educadores ingressam em programas de formação inicial e continuada ofertadas por algumas universidades do país com o intuito de superar as limitações profissionais e os desafios educacionais no contexto das escolas públicas brasileiras e, assim, tornar possível o ensino comunicativo de LI. Dentre esses programas, iremos destacar dois: PROFIPLI (Projeto de Formação Inicial de Professores de Língua Inglesa) e EDUCONLE (Projeto de Educação Continuada para Professores de Língua Estrangeira).

O projeto PROFIPLI (Dutra; Mello, 2004), desenvolvido no Centro de Extensão da Faculdade de Letras (CENEX/FALE) da Universidade Federal de Minas Gerais, objetiva contribuir para a formação teórica e prática de licenciados em Inglês da FALE (Faculdade de Letras). Na primeira fase do projeto, os docentes em formação são expostos aos princípios diretivos, metodológicos e teóricos acerca do ensino de LI. Ao longo do processo, participam de projetos, workshops, ministram aulas, discutem algumas temáticas de sua escolha como, por exemplo, produção de matérias didáticos, processos avaliativos, oficina de narrativas, desenvolvimento de habilidades, formação de professores e outros. Esses licenciados são, a todo momento, estimulados a refletir e discutir sobre suas ações com seus supervisores e seus próprios colegas.

Do mesmo modo, foi criado o EDUCONLE (Dutra; Mello, 2004) no Centro de Extensão da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais. Esse projeto tem por finalidade proporcionar situações de experiências linguísticas e metodológicas para docentes já licenciados que trabalham, prioritariamente, na rede pública de ensino, porém permite a participação de alunos graduados também. É um projeto de extensão com características de ensino e pesquisa, oferece módulos de metodologia e de práticas reflexivas e tem como objetivos principais os itens abaixo:

– Oferecer oportunidades de desenvolvimento linguístico e pedagógico aos professores de LE (inglês e espanhol);

– Contribuir para a aproximação dos graduandos de Letras com a realidade de ensino das escolas públicas;

– Estabelecer relação entre graduados em Letras e professores da rede pública de ensino em projetos de ensino/pesquisa/extensão com a intenção de conscientizar esses profissionais quanto à relevância da educação continuada.

Para melhor expressar a pertinência desses projetos, nos anos de 2011 e 2012, estudantes graduadas (Braz; Alves, 2013) de Letras, por meio da Secretaria Estadual de Educação de Minas Gerais/Superintendência Regional de Ensino de Sete Lagoas, na atribuição de suas funções como Analistas Educacionais, contribuíram com seus conhecimentos adquiridos no projeto EDUCONLE para o Programa de Intervenção Pedagógica dos anos finais do ensino fundamental (6º ao 9º ano). Este programa caracterizou-se pelo acompanhamento pedagógico das ações realizadas pelas escolas com ênfase nas matrizes curriculares das disciplinas e pela capacitação dos profissionais de educação da Jurisdição de Sete Lagoas. A partir das experiências vividas naquele projeto, as graduadas foram capazes de elaborar materiais para oficinas, orientar e dar sugestões durantes as capacitações.

Ambos os projetos aqui comentados são dotados de caráter reflexivo-crítico sobre a prática de ensino com vistas a levar o educador, seja em formação inicial ou continuada, a refletir sobre os problemas de sala de aula e, a partir deles, buscar alternativas de como se pode ensinar e aprender com qualidade.

Sendo assim, é de suma urgência valorizar o trabalho desse profissional, dando-lhe melhores condições de trabalho, bons salários, acesso a uma formação continuada e uma melhor estruturação curricular do curso de Letras. Em vista disso, estaremos incentivando e estimulando a postura reflexiva e, consequentemente, a melhoria da práxis pedagógica.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A postura reflexiva permite que o professor esteja em constante desenvolvimento, pois em cada grupo de alunos com o qual trabalha, pode perceber que há a necessidade contínua de adaptação da sua abordagem de ensinar para que a aprendizagem ocorra de fato. Então, nesse processo de reflexão e adaptação, as suas ações se modificam de acordo com a necessidade do grupo-alvo. Em função disso, o docente de Língua Inglesa precisa estar sempre buscando novos conhecimentos, novas formas de ensino e caminhos que priorizem o desenvolvimento dos discentes.

Com isso, o professor de Língua Estrangeira só tem a aperfeiçoar a sua práxis pedagógica. Contudo, não basta apenas que o professor seja reflexivo. Entende-se que a reflexão crítica sobre a prática ajuda significativamente no processo de ensino e aprendizagem, pois é desse modo que o profissional da educação vai driblando os desafios do ensino de um idioma no contexto da sociedade brasileira, porém, é necessário dar a ele condições para que possa refletir conscientemente, visto que o docente, para realizar tal tarefa, precisa ter uma boa formação inicial e continuada, melhores condições de trabalho, a fim de que tenha tempo disponível e condições psicológicas  para refletir sobre sua forma de ensinar, recursos didáticos e tecnológicos acessíveis e bons salários; bem como, estabelecer contato com os outros personagens responsáveis pelo processo de ensino e aprendizagem, de modo a agregar conhecimentos na busca de soluções dos problemas escolares . E, sobretudo, faz-se mister que ele esteja motivado para desempenhar a tarefa de ensinar uma Língua Estrangeira com prazer e muita criatividade na difícil realidade de ensino no Brasil.

REFERÊNCIAS

ALARCÃO, Isabel. Refletir na prática. Entrevista concedida a Denise Pellegrini. São Paulo: Revista Nova Escola, n. 154. ago. 2002. Disponível em: http://pt.scribd.com/document/83258464/ISABEL-ALARCAO-entrevista. Acesso em: 21 nov. 2020.

ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes. Dimensões comunicativas no ensino de línguas. 4.ed. São Paulo: Pontes Editoras, 2007.

ALMEIDA FILHO, José Carlos Paes. O professor de línguas profissional, reflexivo e comunicativo. In: Horizontes da Linguística Aplicada. ano.3, n.1, Brasília: UNB, 2004.

BARCELOS, Ana Maria Ferreira. Cognição de professores e alunos: tendências recentes na pesquisa de crenças sobre ensino e aprendizagem de línguas. In: BARCELOS, A. M. F.; ABRAHÃO, M. H. V. (orgs.). Crenças e ensino de línguas: foco no professor, no aluno e na formação de professores. Campinas: Pontes, 2006, p.15-41.

BARCELOS, Ana Maria Ferreira. Reflexões acerca da mudança de crenças sobre ensino e aprendizagem. Revista Brasileira de Linguística Aplicada, p.109-138, 2007. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbla/a/qfzDkyppVRGDMQWCGm6K9SQ/?lang=pt &format=pdf.  Acesso em: 21 nov. 2020.

BRASIL. Base nacional comum curricular: educação é a base. 3.ed, Brasília: MEC, 2017.

BRAZ, Thatiane Rosa de Oliveira; ALVES, Selma Aparecida Miranda. Contribuições do educonle para a formação continuada de professores de língua inglesa. In: DUTRA, Deise P.; MELLO, Heliana de Melo (orgs.). Educação continuada: diálogos entre ensino, pesquisa e extensão. v.30, Campinas: Pontes, 2013, p.287-291.

BRITISH COUNCIL. O ensino de inglês na educação pública brasileiro. São Paulo, 2015. Disponível em: https://www.britishcouncil.org.br/sites/default/files/estudo_oensinodoinglesnaeducacaopublicabrasileira.pdf. Acesso em: 22 nov.2020.

CUNHA, Maria Isabel da. O bom professor e sua prática. São Paulo: Papirus, 1989.

DUTRA, Deise Prina; MELLO, Heliana Ribeiro de. A prática reflexiva na formação inicial e continuada de professores de língua inglesa. In: ABRAHÃO, M. H. V. (org.). Prática de ensino de língua inglesa: experiências e reflexões. São Paulo: Pontes, Arte língua, 2004. p.31-41.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 20.ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da educação. São Paulo: Cortez, 1994.

MARANHÃO.  Secretária de Estado da Educação do Maranhão – SEDUC. Documento curricular do território maranhense para educação infantil e o ensino fundamental. 1.ed, São Luís, 2019.

MCKAY, Sandra Lee. O professor reflexivo: guia para investigação do comportamento em sala de aula. São Paulo: SBS, 2003.

MOITA LOPES, Luiz Paulo da. Oficina de linguística aplicada: a natureza social e educacional dos processos de ensino/aprendizagem de línguas. Campinas: Mercado de Letras, 1996.

MORALES, Pedro. A relação professor-aluno: o que é e como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.

NEVES, Maralice de Souza. Os mitos de abordagens tradicionais e estruturais ainda interferem na prática em sala de aula. In: PAIVA, V. L. M. O. (org.). Ensino de língua inglesa: reflexões e experiências. Campinas: Pontes; Minas Gerais: Departamento de Letras Anglo Germânicas – UFMG, 1996, p.69-80.

NÓVOA, Antônio. Os professores e sua formação. Portugal: Dom Quixote, 1997.

PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira e. A identidade do professor de língua inglesa. Apliemge: ensino e pesquisa. n.1, Uberlândia, 1997, p.9-17. Disponível em: http://www.veramenezes.com/ identidade.htm. Acesso em: 22 jul. 2019.

TAPIA, Jesús Alonso; FITA, Enrique Caturla. A motivação em sala de aula: o que é e como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.

APÊNDICE – NOTA DE RODAPÉ

2. A Base Nacional Comum Curricular é um documento que orienta todos os Documentos Curriculares da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio dos diferentes territórios brasileiros.

3. O termo multiletramento é usado na BNCC (Brasil, 2017, p. 242) para referir-se a multiplicidade de linguagens, que se encontram espalhadas na sociedade através de diferentes formatos de textos, ou seja, textos orais, visuais, auditivos, gestuais, espacial e táctil, além da escrita, que foram ganhando espaço na sociedade devido aos avanços tecnológicos.

4. A BNCC (Brasil, 2017, p. 243- 245), objetivando o desenvolvimento de habilidades e competências na LI, propõe uma organização do ensino de idioma em cincos eixos: oralidade, leitura, escrita, conhecimentos linguísticos e gramaticais, e dimensão intercultural.

5. A competência implícita corresponde às ideologias, às crenças, e às experiências do docente adquiridas no cotidiano escolar e ao longo de sua vivência enquanto aluno. A linguística-comunicativa diz respeito ao conhecimento sobre a língua e à capacidade de uso da mesma. A teórico-aplicada corresponde ao conhecimento teórico sobre ensinar e aprender língua. E, por último, a profissional, que constitui o reconhecimento pelo professor de seu papel e valor no exercício do magistério.

6. Postura sincrética é um termo usado para definir a capacidade do professor em fazer uso daquilo que há de melhor nos métodos e nas abordagens de ensino de línguas.

7. https://www.planocde.com.br/

8. https://www.britishcouncil.org.br/

[1] Pós-graduação – lato sensu em Metodologia de Ensino de Língua Inglesa e Graduação em Letras com habilitação em Língua Inglesa. ORCID: https://orcid.org/0009-0009-5709-3491. Currículo Lattes: https://lattes.cnpq.br/6121129695097332.

Material recebido: 13 de junho de 2024.

Material aprovado pelos pares: 20 de setembro de 2024.

Material editado aprovado pelos autores: 20 de fevereiro de 2025.

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Fabienne Matos

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